domingo, 3 de junho de 2012

CONTRATOS COM OSCIP. Posicionamento do TCE SP em Consulta.




Tribunal Pleno - Sessão de 05.05.2004 - Item 16
Consulta TC-002149/006/02
Consulente: Henrique Lopes - Prefeito do Município de Patrocínio Paulista.
Assunto: Consulta sobre contratos da Administração Pública objetivando os Programas da Saúde e seus gastos, após a Lei de Responsabilidade Fiscal (LC nº101/2000).
PEDIDO DE VISTA DO CONSELHEIRO EDUARDO BITTENCOURT CARVALHO
ESTE PROCESSO INTEGROU A PAUTA DOS TRABALHOS DO E. TRIBUNAL PLENO NA SESSÃO DE 24/03/2004 OPORTUNIDADE EM QUE, APÓS O RELATOR TER SE MANIFESTADO, CONFORME RELATÓRIO E VOTO ABAIXO, PEDIU VISTA O EMINENTE CONSELHEIRO EDUARDO BITTENCOURT CARVALHO.
RELATÓRIO
Tratam os autos de consulta formulada pelo Prefeito de Patrocínio Paulista, Senhor Henrique Lopes, indagando:
1º) da possibilidade de a Administração Pública Municipal firmar vínculo de cooperação por meio de contrato de gestão (Organizações não Governamentais), termos de parceria (Organizações Sociais de Sociedade Civil de Caráter Público) e convênios ou contratos de direito público (Associações), com vistas à operacionalização do Programa Nacional de Saúde da Família - PSF e do Programa de Agentes Comunitários de Saúde - PACS.
2º) se os recursos destinados a cobrir tais ajustes são computados na base de cálculo dos gastos com pessoal, previsto pela LRF.
O protocolado foi recebido como consulta pela E. Presidência (fls.33).
Unidade Jurídica da Assessoria Técnica e Chefia de ATJ consideraram necessária a existência de Lei Municipal específica para a celebração de contratos de gestão com organizações sociais, e que os gastos decorrentes não se enquadram nos limites do artigo 19 da LRF.
SDG entende que, se a terceirização alcançar todo o serviço, por meio de pessoa jurídica desvinculada da Administração, a despesa será registrada no elemento outros serviços de terceiros, e se houver contratação direta de mão-de-obra, estará caracterizada a inserção em Outras Despesas de Pessoal, de acordo com o artigo 18, § 1º da LRF. 
É o relatório.
VOTO
O pedido foi formulado por parte legítima e de acordo com as regras do artigo 224 do Regimento Interno. Assim, conheço da consulta.
Para abordar o seu primeiro item cabe, inicialmente, consignar que, de acordo com a Lei Orgânica da Saúde (art. 27 da Lei Federal nº 8.080/90)1, a política de recursos humanos da área é formalizada e executada articuladamente pelas diferentes esferas de governo, com responsabilidade pela seleção, contratação e remuneração dos profissionais delegada às unidades federadas executoras.

Vale lembrar, ainda, que, conforme o § 1º do artigo 199 da Constituição Federal, é permitido às instituições privadas participar de forma complementar do sistema único de saúde, mediante contrato de direito público ou convênio.
No caso da União, para o funcionamento da parceria (Estado/Sociedade), promulgou-se a Lei Federal nº 9.637/98 (art.1º)2, prevendo que as pessoas jurídicas de direito privado, já existentes, sem fins lucrativos, podem se qualificar como Organizações Sociais - OS (art.2º) e, como tais, sob a égide de um contrato de gestão (art.5º)3, receberem bens públicos e recursos financeiros (art.12, §1º)4, com vistas a atingir metas e resultados no desenvolvimento de atividades dirigidas às áreas de ensino, pesquisa científica, desenvolvimento tecnológico e institucional, proteção e preservação do meio ambiente, defesa do consumidor, cidadania, cultura e saúde.
Segundo Eurico de Andrade Azevedo, em estudo denominado "Organizações sociais", publicado no "site" www.pge.sp.gov.br, consultado em 26.02.04: 
"O objetivo declarado pelos autores da reforma administrativa, com a criação da figura das organizações sociais, foi encontrar um instrumento que permitisse a transferência para as mesmas de certas atividades que vêm sendo exercidas pelo Poder Público e que melhor o seriam pelo setor privado, sem necessidade de concessão ou permissão. Trata-se de uma nova forma de parceria, com a valorização do chamado terceiro setor, ou seja, serviços de interesse público, mas que não necessitam sejam prestados pelos órgãos e entidades governamentais."

Conforme Zélio Maia em texto "Organizações Sociais - "O Terceiro Setor e a Modernização dos Serviços Públicos", divulgado no "site"  www.vemconcursos.com.br, consultado em 26.02.04
"As organizações sociais situam-se no denominado terceiro setor, ou seja, estão localizadas entre o Estado (primeiro setor) e o mercado (segundo setor). Em síntese, as organizações sociais constituem-se em pessoas jurídicas de direito privado sem finalidade lucrativa que prestam serviço de interesse público."
Destaque-se que a Lei Federal nº 9.648/98 acrescentou o inciso XXIV ao artigo 24, da Lei de Licitações e Contratos Administrativos, prevendo a possibilidade de as organizações sociais firmarem com a administração pública contrato de gestão com dispensa de licitação.
"Art.24 - É dispensável a licitação:
XXIV - para celebração de contratos de prestação de serviços com as organizações sociais, qualificadas no âmbito das respectivas esferas de governo, para atividades contempladas no contrato de gestão."
Além disso, consoante a seção IV da Lei das Organizações Sociais, a fiscalização da execução do contrato de gestão será efetuada pelo órgão ou entidade supervisor da área de atuação correspondente à atividade fomentada (art.8º), que deverá comunicar qualquer irregularidade ou ilegalidade na utilização de recursos e bens de origem pública ao Tribunal de Contas (art.9º) e ao Ministério Público (art. 10).
Da mesma forma, por meio da Lei Federal nº 9.790/99, regulamentada pelo Decreto nº 3.100/99, criou a União a possibilidade de qualificação das pessoas jurídicas de direito privado, sem fins lucrativos, como Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público - OSCIP, objetivando, nos termos da celebração de um Termo de Parceria (art.9º)5, o fomento e a realização de projetos referentes a atividades complementares à ação do Estado (art.3º, IV)6.
Com vistas ao desenvolvimento de projetos voltados às diversas atividades sociais previstas no artigo 3º da referida lei, o órgão estatal poderá realizar concurso de projetos para a escolha da Oscip que celebrará o mencionado termo de parceria (arts. 23 a 31 do Decreto nº 3.100/99)7.
Conforme cartilha denominada "A lei 9.790/99 como Alternativa para o Terceiro Setor", 2ª Edição, divulgada pelo programa Comunidade Solidária divulgada no "site" www.comunidadesolidaria.org.br, o concurso de projetos tem as seguintes características:
"O edital do concurso deve conter informações sobre prazos, condições, forma de apresentação das propostas, critérios de seleção e julgamento e valores a serem desembolsados.
O julgamento é feito por uma Comissão designada pelo órgão estatal, que avalia o conjunto das propostas das OSCIPs. Não serão aceitos como critérios de julgamento quaisquer aspectos - jurídicos, administrativos, técnicos ou operacionais - que não tenham sido estipulados no edital do concurso." 
São exemplos de experiências de concursos de projetos com organizações sem fins lucrativos o "Programa Nacional DST/AIDS" do Ministério da Saúde, divulgado no "site" www.aids.gov.br e o "Programa Capacitação Solidária/Conselho da Comunidade Solidária", exposto no "site" www.pcs.org.br.
Para a celebração de convênios e contratos de direito público a administração deverá seguir os preceitos previstos na Lei de Licitações e Contratos Administrativos.
Deste modo, como já fizeram a União (Lei Federal nº 9.637/98 e Lei Federal nº 9.790/99) e o Estado (Lei Complementar nº 846/98), a Prefeitura poderá celebrar acordo com as mencionadas organizações, desde que haja legislação municipal que discipline a matéria e sejam observados os procedimentos de seleção das entidades interessadas em desenvolver as atividades inerentes aos mencionados programas. 
Conforme o "Manual de Perguntas e Respostas", elaborado pelo grupo de estudos, supervisionado pelo Secretário Diretor Geral, os gastos com pessoal oriundos dos acordos entre a Administração Pública e as mencionadas organizações para atender o Programa de Saúde da família - PSF e o Programa de Agentes Comunitários de Saúde - PACS não são computados no limite previsto pelo inciso III, do artigo 19 da LRF8, mas como despesas com serviços de terceiros, tendo em conta que o vínculo empregatício se verifica apenas com a entidade contratada. 
Também não há falar que tais gastos se enquadram no § 1º do artigo 18 do mesmo diploma legal9, eis que não há substituição de servidores e empregados públicos.
"Diante disso, se a terceirização alcançar todo o serviço, processando-se por intermédio de pessoa jurídica organicamente desvinculada da Administração, a despesa continua sendo classificada no elemento Outros Serviços de Terceiros (3132). A Administração contratando todo o serviço, a mão-de-obra fica vinculada tão somente à empresa contratada, ou seja, não diz respeito à Administração Pública contratante."
No mesmo caminho percorre o entendimento do Tribunal de Contas do Paraná em "Aspectos Gerais da Lei de Responsabilidade Fiscal, outubro 2000, destacado na obra "Lei de Responsabilidade Fiscal Comentada Artigo por Artigo" , de Flávio C. de Toledo Júnior e Sérgio Ciquera Rossi, 1ª Edição, fls.106.
"Não serão consideradas como despesas de pessoal as de terceirização que tenha a ver com: contratos em que não se especifique a quantidade e/ou especialização dos funcionários, salvo se necessário à caracterização do objeto, bem como que não esteja caracterizada qualquer subordinação, vinculação ou pessoalidade entre a Administração e os funcionários da contratada." (g.n)
Diante do informado, entendo que a primeira questão deva ser respondida no sentido de que é possível a contratação de Organizações Sociais, Organizações Sociais de Sociedade Civil de Caráter Público e Associações para a operacionalização do Programa de Saúde da Família e do Programa de Agentes Comunitários de Saúde, desde que precedida de lei municipal dispondo sobre a matéria e que sejam observados os respectivos procedimentos de seleção das entidades interessadas em celebrar contratos de gestão, termos de parceria e convênios ou contratos com a Prefeitura local.
Em resposta à outra indagação abordada pelo consulente, pode-se afirmar que os gastos decorrentes dos ajustes não se enquadram nos limites estabelecidos pelo artigo 19 da LRF.
É o meu Voto.

RELATOR-CONSELHEIRO EDGARD CAMARGO RODRIGUES

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