sábado, 15 de novembro de 2008

Vínculo Jurídico de Emprego dos Agentes Comunitários de Saúde com o Município. Parecer.

* Nildo Lima Santos. Consultor em Administração Pública.


I - INTRODUÇÃO:

1. O Departamento de Atenção Básica da Secretaria de Políticas de Saúde do Ministério da Saúde é o órgão federal responsável pela implantação nos Municípios brasileiros do Programa de Agentes Comunitários de Saúde (PACS), que trata de parceria entre a União os Estados e os Municípios para o cumprimento de diretrizes básicas de saúde em todo o território nacional.

2. O termo de parceria consiste nas seguintes atribuições dos parceiros:

a) Pelo Governo Federal:

• transferir recursos para financiamento das ações do programa, sob a forma de incentivos fundo a fundo;

• contribuir para que a atenção básica à saúde seja gerenciada de forma plena pelo município, dando uma nova orientação ao modelo de assistência vigente;

• definir normas e diretrizes para implantação de Agentes Comunitários de Saúde;

• definir mecanismo de alocação de recursos federais para implan tação e manutenção de ACS, de acordo com seus princípios básicos;

• dar assessoria técnica contínua aos estados e aos municípios;

• tornar disponíveis instrumentos que facilitem a capacitação doa ACS e dos instrutores/supervisores;


• implementar o SIAB, para monitorar as ações desenvolvidas pelos ACS, e fornecer o apoio necessário, para que ele funcione adequadamente e;

• consolidar, analisar e divulgar os dados geradores pelo SIAB;

• identificar recursos técnicos e científicos para o processo de controle e avaliação dos resultados e do impacto das ações dos ACSs;

• articular e promover o intercâmbio de experiências, para aperfeiçoar e disseminar a tecnologia voltada para a atenção primária à saúde.


b) Pela Secretaria Estadual de Saúde:


• assessorar os municípios, de forma a capacitá-los para assumir a gestão plena da atenção básica à saúde, com o objetivo de reorientar o modelo de assistência;

• definir estratégias de implantação e/ou implementação de equipes de ACSs;

• nomear responsáveis pela divulgação e articulação com os municípios;

• participar do processo de definição das normas que regem o trabalho do ACS, no Ministério da Saúde;

• apresentar e negociar com o Conselho Estadual de Saúde e com a Comissão Intergestores Bipartite, os requisitos para a implantação de ACS;

• fornecer assessoria técnica aos municípios, em todas as fases de implantação de ACS;

• colocar à disposição dos municípios, instrumentos que facilitem a capacitação dos ACSs, dando apoio à capacitação técnica dos enfermeiros instrutores/supervisores;

• dar assessoria técnica para que o SIAB seja implantado e entre em funcionamento;

• coordenar, controlar e avaliar as atividades de ACS por meio do SIAB;


• consolidar e analisar os dados gerados pelo SIAB, de forma articulada com os demais setores da Secretaria Estadual de Saúde;

• identificar recursos técnicos e científicos para o processo de controle e avaliação dos resultados e do impacto das ações dos ACSs no âmbito do estado;

• promover de forma articulada, o intercâmbio de experiência entre os diversos municípios, procurando disseminar novas tecnologias, sempre voltadas para a melhoria do atendimento primário à saúde;

• identificar possíveis parcerias com organizações governamentais e não-governamentais no âmbito do estado.


c) Pelo Município:


• cumprir as normas e diretrizes para o trabalho de ACS;

• submeter a proposta de implantação de ACS à aprovação do Conselho Municipal de Saúde;

• buscar assessoria da Coordenação Estadual ou Regional para planejar todas as etapas de implantação;

• inserir as ações de ACS no Plano Municipal de Saúde;

• garantir infra-estrutura de funcionamento da rede básica, indispensável ao pleno desenvolvimento das ações dos ACSs;

• assegurar a presença, na unidade básica de saúde de referência dos ACSs, de um enfermeiro que exerça o papel de instrutor/supervisor, considerando que a proporção de profissionais deve ser, no máximo, de 30 ACSs para cada enfermeiro;

• organizar e executar o processo seletivo para ACS, efetuando a contratação dos aprovados para cada micro área;

• viabilizar, com o apoio da Secretaria Estadual de Saúde, a capacitação técnica dos instrutores/supervisores;
• garantir educação permanente e instrumentos de trabalho para a capacitação técnica dos ACSs;

• implantar e alimentar o SIAB, cumprindo o fluxo estabelecido de envio de dados aos níveis regional e estadual;

• programar as ações e as atividades dos ACSs, em estreita vinculação com a respectiva unidade básica de saúde e com os problemas prioritários de cada comunidade;

• identificar a possibilidade de parcerias com organizações governamentais e não-governamentais para desenvolvimento do PACS no município.


3. É necessário que o Agente Comunitário de Saúde atenda a alguns pré-requisitos básicos definidos para o sistema, pela União, através do Decreto Federal n.º 3.189, de 04 de outubro de 1999 e, que ainda está em pleno vigor. Dentre todos os mais importantes estão relacionados diretamente à própria condição necessária para a caracterização da funcionalidade das ações comunitárias de saúde que se reveste de uma filosofia particular que ultrapassa o entendimento tradicional sobre a formação dos cargos públicos. Citaremos então alguns destes pré-requisitos:

a) Relacionados à Natureza e Função do ACS:


• o Agente Comunitário de Saúde é um profissional sui generis. Oriundo da comunidade , como alude a sua denominação, deve exercer uma liderança entre os seus pares, apresentando um perfil distinto do servidor público clássico. Na seleção de um servidor comum procura-se, a princípio, a pessoa mais qualificada tecnicamente para o exercício daquele mister. Aqui, não necessariamente. São fundamentais os aspectos de solidariedade e liderança, a necessidade de residir na própria comunidade e o conhecimento da realidade social que o cerca. Os ensinamentos técnicos virão depois, mediante os cursos ministrados pelo Poder Público. Assim, em primeiro lugar, busca-se, para o ACS, um perfil mais social do que burocrático ou técnico. Essa distinção é fundamental neste trabalho. Na verdade, esse traço identificador dessa categoria é o pilar das eventuais dificuldades que se encontram para se construir o modelo jurídico de sua contratação. Se assim não fosse, não haveria qualquer dúvida de que os ACSs deveriam ser submetidos aos mesmos comandos e regras próprios dos demais servidores públicos, em regime estatutário ou celetista, mediante prévia aprovação em concurso público, e vinculados às características desses regimes, inclusive estabilidade e regime disciplinar específico. Todavia, a diferenciação não permite essa solução simplista. (É o que afirma o Ministério da Saúde em matéria sobre o assunto publicado pela Editora MS – Brasília – Df., com o título “Modalidade de Contratação de Agentes Comunitários de Saúde: um pacto tripartite”, pg. 09 – Ed.. Janeiro de 2002.).


b) Relacionados às Atividades do ACS:


• O Agente Comunitário de Saúde tem suas atribuições básicas descritas em documentos do Ministério da Saúde e, mais solenemente, no bojo do Decreto Federal n.º 3.189, de 04 de outubro de 1999, que “fixa diretrizes para o exercício da atividade de Agente Comunitário de Saúde, e dá outras providências”. Atividades estas que estão descritas no artigo 2.º de tal Decreto.

• O Agente Comunitário de Saúde tem a missão básica de execução de atividades de prevenção de doenças e promoção da saúde no âmbito da comunidade em que resida, e na qual tenha liderança e possa manifestar solidariedade. Esse aspecto, muitas vezes subjetivo, é de assombrosa relevância para o Programa, pois de nada adiantará um ACS muito preparado tecnicamente que não possa desenvolver a contento suas atividades por não ter credibilidade na esfera da comunidade em que atue.(Grifo nosso).

• O ACS deverá ser uma pessoa confiável, bem conceituada na comunidade, amena no trata, com acesso às residências, como se fosse alguém da família. E o ACS só será útil enquanto manifestar essa liderança, pois que se a perder não poderá mais exercê-la com as mesmas características, as suas atribuições regulares. Por esse perfil, já se antevê a inviabilidade de se cogitar o servidor público comum para tal função. (Grifo nosso).


c) Relacionados ao Processo de Seleção e Provimento do Cargo de ACS:


• Não é recomendável a realização de concurso público para os ACSs, no qual são exigidos procedimentos rígidos quanto a formalidade jurídica do cargo e do processo seletivo. A seleção do ACS é bem mais simples, e com pouca formalidade, devendo observar tão somente os requisitos do cargo. Cargo este temporário e, de ocupação também, temporária, para atender a necessidade de programa conveniado entre a União, Estado Federado e Município. Deve, a rigor, a seleção do ACS atender a conveniência do programa definido pelo Governo Federal e, isto é tudo, o qual tem a plena liberdade para contratá-lo e para demiti-lo, a qualquer tempo que ache necessário de acordo com o julgamento da autoridade contratante.

• O processo seletivo se dá mediante edital no qual se estabelece requisitos que valorizem, à exaustão, a comprovação dos critérios de liderança e solidariedade, imprescindíveis para o exercício pelo ACS, bem como, sua capacidade para o aprendizado, responsabilidade no desenvolvimento de suas tarefas, respeito e lealdade para com as autoridades constituídas, dos múltiplos organismos Municipais, Estaduais e Federais, pois é ele, o ACS, o porta-voz do poder público constituído junto às comunidades, dentro do Município – principalmente nos assuntos relacionados à área de saúde - e, dele é exigido lealdade para com as instituições públicas.

• Os ACSs não tem o perfil de servidores públicos burocratizados, com estabilidade no serviço público pois, sempre que deixem de atender os requisitos essenciais de liderança, solidariedade, responsabilidade, confiabilidade e, fidelidade com as instituições públicas, ou até mesmo se mudem daquela comunidade, perecem os elementos identificadores de sua legitimidade na respectiva comunidade e, portanto, deixarão de atenderem ao programa e serão, inevitavelmente, substituídos.



II - SITUAÇÃO JURÍDICA DE VÍNCULO DE EMPREGO DO ACS:

4. A contratação do ACS, a despeito do que afirma a Secretaria de Políticas de Saúde do Ministério da Saúde, e grande responsável pela geração de embaraços jurídicos aos municípios, poderá se dar sob duas formas consideradas juridicamente aceitas e legais por permitir que sejam estendidos a estes,em grande parte, os benefícios sociais, - os mesmos que são estendidos aos servidores públicos em geral, tais como férias, abono de férias, 13.º salário, licença-maternidade, e previdência – quando se tratar do primeiro caso que é de contratação pela lei da temporariedade, a qual deverá ser bem elaborada de forma que permita a contratação por maior tempo de cargos que somente terão vida enquanto tiver vida o programa e o convênio determinado, cujo amparo legal é o Inciso IX, do artigo 37 da Constituição Federal . E, no segundo caso através de terceirização por convênio com Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP), cujo regramento jurídico se encontra traçado na Lei Federal n.º 9.790, de 23 de março de 1999 e, no Decreto n.º 3.100, de 30 de junho de 1999. Neste segundo caso a contratação se dará através do regime trabalhista onde todos os direitos sociais previstos para esta categoria são assegurados, inclusive o FGTS. Em ambos os casos porém o exercício do cargo de Agente Comunitário de Saúde está sujeito a ser suspenso a qualquer momento pelo empregador, ou o Município ou a OSCIP. Esta é a regra. Entretanto, neste último caso a figura do Município fica mais afastada da decisão de admitir e de demitir o Agente Comunitário de Saúde, que se prenderá mais à fiscalização da execução dos serviços pela OSCIP, já que a relação desta entidade é bem mais forte e mais direta com o Ministério da Saúde e de seus organismos responsáveis pela execução do Programa.

5. O Município ao contratar o Agente Comunitário de Saúde, o faz dentro dos permissivos constitucionais (Art. 29, caput; Art. 30, I, IV, V, e VII; Art. 37, inciso I e IX) e, dentro dos permissivos legais (Art. 17. , IX; e, Art. 18 da Lei Orgânica do Município de Remanso) e, ainda, observando, para que se cumpra o princípio da legalidade, a forma disciplinar estabelecida pelo estatuto dos funcionários públicos municipais para o exercício das atribuições inerentes ao cargo, não importando a natureza de tempo para as contratações, se permanentes ou temporárias.

6. Destarte, cabe ao administrador público velar e zelar pelo cumprimento da lei e, da aplicação das penas disciplinares, inclusive quando se tratar de demissões, que é revestida de grande formalidade para o Servidor Estável e, de menor formalidade para o servidor temporário, principalmente quando este é contratado pela lei da temporariedade. Tirar o poder do agente dirigente administrativo para esta decisão é usurpar-lhe as suas funções, o que é muito grave no sistema de administração pública brasileiro. Seria negar o direito legal de quem tem o dever de agir (poder-dever), e criar direitos para outrém. Direitos que a lei não o concedeu. Portanto, é forçoso afirmar que somente aquele que tem o poder de contratar tem o poder de demitir, quando se trata de situações temporárias para a administração pública municipal, como é o caso dos Agentes Comunitários de Saúde que estão exercendo atribuições conveniadas com outras esferas de governo cujo julgamento na permanência ou não do ACS, dependerá unicamente do ente-contratante (empregador) e executor do programa e do convênio.

7. Convém alertarmos que, no pior das hipóteses, os entes partícipes do convênio poderão sugerir providências de cada um dos parceiros e, neste caso em questão, do Município; se ficar caracterizado abuso da autoridade ou desvio de finalidade do instrumento pactuado. Ou em situações muito graves, a rescisão do convênio ou do acordo. O que tem que ficar preservado é a vontade e os interesses do Município e a autoridade de quem os representa sob o risco da ingovernabilidade e de graves prejuízos à sociedade local que o Ministério Público tem a obrigação de zelar porque é assim que definem as normas que deram a arquitetura do Estado Brasileiro sendo Remanso um de seus elementos, como os são os demais municípios brasileiros.

8. O contrato dentro da temporariedade, através de lei específica, apesar do rito de sua promoção meio de processo seletivo público se comporta da mesma forma que o contrato administrativo e, a este se assemelha. Tanto um quanto o outro prevalece o interesse público que está em primeiro lugar nas relações contratuais que se estabelecem entre a Administração Pública e o particular. Ao contratar com o Estado, ninguém adquire o direito à perenidade do Contrato nem a sua execução integral. É preceito de ordem pública que a Administração pode modificar o Contrato unilateralmente. Só não o pode rescindir sem o justo motivo. E, o justo motivo, no caso de contratos de prestação de serviços temporários é sempre a juízo do administrador e supervisor do servidor contratado com esse vínculo jurídico de trabalho. O ato de rescisão, apesar de ser vinculado, é bem mais simples do que os contratos administrativos pois é extremamente revestido da precariedade. E, a vinculação restringe-se tão somente ao que dispõe as leis municipais e aos demais atos normativos expedidos pela autoridade competente.


III – CONCLUSÃO:

9. Orientamos esse Município de Remanso a implantar mecanismos que possam avaliar rotineiramente e sistematicamente o desempenho dos servidores com cargo de Agente Comunitário de Saúde, fazendo constar em seus assentamentos todas irregularidades e desvios de conduta possivelmente detectadas e, todas as providências relacionadas à aplicação de penas, tais como: advertências, suspensões, Notificações e outras previstas no Estatuto dos Funcionários Públicos do Município de Remanso. Estas providências servirão para justificar o afastamento do servidor sem o risco de dúbias interpretações por qualquer autoridade judiciária.

10. Aconselhamos pela manutenção da decisão sobre o afastamento de Agentes Comunitários de Saúde que se portaram mal contra as autoridades constituídas para que se mantenha a ordem e para que se estabeleça o respeito às autoridades constituídas do Município e se preserve o princípio da hierarquia e da independência do Município, mesmo que este tenha que restabelece-lo perante os tribunais superiores que são os virtuais caminhos para a correção de decisões equivocadas do judiciário de primeira instância.

11. É o Parecer.

Juazeiro, Ba., em 11 de novembro de 2002.

NILDO LIMA SANTOS
Consultor em Administração Pública

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