Ref.: PROCESSO DE INFRAÇÃO Nº 2006027831, de 16/11/2006.
O Município de Casa Nova, Estado da Bahia, pessoa jurídica de direito público interno, inscrito no CNPJ sob o nº sob o nº 13.691.811/0001-28, com sede na Praça Dr. Gilson Viana de Castro, s/n, Centro, Casa Nova - Bahia, representado neste Ato pelo Procurador Municipal Dr. ..............., Procurador Geral do Município, em pleno exercício de suas funções, OAB/BA ............., com amparo no inciso LV do artigo 5º da Constituição da Republica Federativa do Brasil, que garante o direito do contraditório e, ainda, amparado pelo artigo 78 da Lei Federal 5.194, de 24 de dezembro de 1966, vem perante o Plenário desse Conselho Regional de Engenhariae Arquitetura (CREA), apresentar recurso por carência de objeto, tendo como argumentação o que segue:
1. A alínea “e” do artigo 73 da Lei Federal 5.194/66 prevê multas de meio até três salários mínimos para pessoas jurídicas, por infração ao artigo 6º, sendo que este tipifica os que exercem ilegalmente atribuições reservadas aos profissionais de engenharia, arquiteto ou agronomia, o que no nosso entender não cabe a este Município que, tem como competência legal e constitucional, o exercício de atribuições na execução dos serviços públicos, dentre eles o de coleta de lixo, que é feita por servidores com o cargo de coletores de lixo, que tem como pré-requisito de formação, apenas, a exigência de que seja este alfabetizado e, cujo transporte de resíduos sólidos (do lixo) é feito por veículo coletor conduzido por motorista, cujo cargo, também, tem como pré-requisito de formação, apenas o ensino fundamental incompleto. O mesmo ocorrendo na operação do lixão, já que o Município não tem aterro sanitário, que é operado por operadores de máquinas pesadas (Trator D-4), cujo pré-requisito exigido para ocupação do cargo, quanto a formação, é de tão somente o ensino fundamental incompleto, tudo na forma da Lei Municipal. Amparam o Município no exercício das atribuições de coleta de lixo, limpeza publica, operação do aterro sanitário e, transporte de resíduos sólidos, o inciso V do artigo 30 da Constituição Federal.
2. Uma outra questão é o fato de que o Artigo 7º da Lei Federal 5.194/66, que trata das atividades e atribuições dos profissionais de engenharia, arquitetura e agronomia, em momento algum lista as atividades de coleta de lixo, transporte de resíduos sólidos e, operação de lixões, como atividades reservadas a estes profissionais.
3. E, se a multa é em decorrência do planejamento destas atividades, pior ainda para a fiscalização que não observou que tais atividades são planejadas e coordenadas pelo Engenheiro ..................... com CREA ........./BA, que ocupa a pasta de Secretário de Obras e Serviços Públicos do Município de Casa Nova, cujo departamento de limpeza pública a ele se subordina.
4. Não nos cai sob os sentidos de que as atribuições de coleta de lixo, de transporte de lixo, de movimentação de lixo em lixões, sejam reservadas a engenheiros, portanto, não cabe aqui invocar o disposto no artigo 12 da Lei Federal 5.194/66, a seguir transcrita:
“Art. 12. Na União, nos Estados e nos Municípios, nas entidades autárquicas, paraestatais e de economia mista, os cargos e funções que exijam conhecimentos de engenharia, arquitetura e agronomia, relacionados conforme o disposto na alínea “g” do art. 27, somente poderão ser exercidos por profissionais habilitados de acordo com esta lei.”
5. Resta portanto, que seja comprovado, como se pretende os fiscais do CREA, que as funções de Coletor de Lixo, Condutor de Veículo Coletor de Lixo e, de Operador de Máquina Pesada, exijam conhecimentos de engenharia e que constem de listas elaboradas pelo Conselho Federal, assim como está definido no artigo 27 alínea “g” de tal instrumento em questão (Lei Federal 5.194/66).
6. Uma outra observação a ser feita é no tocante à autoridade do CREA no poder de aplicar multas quando se relaciona com os entes públicos de direito público interno (administração direta). Então vejamos, até que ponto é permitida a interferência do CREA junto a tais instituições:
6.1. O CREA é uma autarquia federal, portanto, é uma instituição pública federal e, para tanto, trilha pelos mesmos princípios que regem as demais instituições públicas, destarte, dentre eles, o mais importante, que é o de não se sobreporem umas às outras.
6.2. É o Município de Casa Nova, pessoa jurídica de direito público interno e, melhor compreendida como sendo ente federado do Sistema Federativo do Brasil, representado pelos Poderes Executivo Municipal e Legislativo Municipal, ambos, respectivamente, com sede na Cidade de Casa Nova.
6.3. É a PREFEITURA MUNICIPAL a denominação do local onde se encontra instalada a Administração Direta do Poder Executivo Municipal que exerce as prerrogativas do ente federativo municipal que lhe foi imposto por força da Constituição Federal e da Lei Orgânica do Município de Casa Nova.
6.4. Em se tratando de servidor público para o exercício de cargo público, a Lei que criou o cargo, não sendo esta ilegal e, cuja constatação somente poderá ser mediante declaração pela via judicial, esta é suficiente para o reconhecimento do exercício das atribuições pelos servidores públicos contratados pelos entes federados. Sobre a matéria assim já se pronunciou o Tribunal de Contas da União na decisão:
TC-002.854/2002-0:
“..............................................................................
9. Conjugando-se, então, os objetivos a que se presta a ART e o objeto da solicitação do CREA/DF, é possível se inferir que a intenção daquela entidade em obter informações de tal espécie destina-se a fiscalizar os servidores de níveis superior e médio desta Corte de Contas detentores de habilitação profissional nas áreas de engenharia, arquitetura, agronomia, geologia, geografia e meteorologia, quanto ao exercício, no âmbito das atribuições de competência deste Tribunal, de atividades em alguma ou nalgumas daquelas áreas profissionais no Distrito Federal.
10. Nessa perspectiva, a inferência acima aduzida conduz à questão de saber se o desenvolvimento de atividades pelos servidores deste Tribunal, no âmbito do controle externo da Administração Pública Federal, caracteriza o exercício de atividade afeta às áreas de profissões regulamentadas, entre estas as mencionadas pelo CREA/DF, sujeitando-se ou não esta Corte de Contas, em conseqüência, à fiscalização dos Conselhos Regionais relativos a cada profissão.
11. O exame de tal matéria não é inédito neste Tribunal. Já deliberou a respeito esta Corte de Contas em outras oportunidades, podendo-se citar a Decisão nº 83/93-TCU-Plenário (Sessão de 24/03/93, Ata nº 10/93, DOU de 07/04/93), proferida no processo TC-020.794/90-8, em que o Presidente do CONFEA solicitava, com o intuito de salvaguardar os direitos dos profissionais de engenharia ante o que dispõe o art. 27, alínea c, da Lei 5.194/66, informações quanto à qualificação do corpo funcional do Tribunal responsável pela realização de auditorias operacionais e à natureza do vínculo empregatício, especialização e ouros esclarecimentos julgados necessários, já que os técnicos, nas fiscalizações, poderiam estar elaborando laudos ou pareceres privativos de engenheiros. O teor do referido decisium foi o seguinte:
‘O Tribunal Pleno, diante das razões expostas pelo Relator, DECIDE, nos termos do art. 1º, inciso XVII, da Lei nº 8.443/92 (...)
4. informar ao Senhor Presidente do Conselho Federal de Engenharia, Arquitetura e Agronomia – CONFEA que os servidores do TCU são selecionados mediante concurso público, em que se admite a participação de portadores de curso superior ou habilitação legal equivalente, devidamente registrado, em qualquer área de formação, inclusive engenharia, arquitetura e agronomia; (...)’
12. Pode-se citar, também, deliberação mais recente desta Corte de Contas que elucida de forma minuciosa e suficiente matéria idêntica à questão vertente nos presentes autos.
6.5. Sendo o CREA autarquia Federal e, o Município de Casa Nova um ente federativo (pessoa jurídica de direito público interno), é forçoso reconhecermos que, estará o primeiro (CREA) limitado a suas ações perante o segundo (Município de Casa Nova), vez que, a segurança jurídica da constituição do Estado Brasileiro, assim não permite. Uma vez ferido este princípio com a intervenção de um ente federado sobre o outro, estar-se-á ferindo o princípio do federalismo e, consequentemente, o princípio da autonomia dos entes federados. Sobre matéria idêntica já se pronunciou o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo em Acórdão em Apelação Cível nº 191.648 – 2/4, da Comarca de Itanhaém:
“Assim sendo, a aplicação de sanção administrativa por um ente de direito público a outro ente de direito público, se constitui em intervenção não prevista na Constituição, por um ente de direito público na esfera de atribuições administrativas de outro ente de direito público, cerceando a autonomia administrativa estabelecida pela Constituição para o ente de direito público interno.”
6.5. Neste mesmo diapasão o Tribunal Regional Federal assim já decidiu sobre multas impostas às Prefeituras pelo INSS em Agravo de Instrumento nº 90.04.05406-5-RS, da 2ª Turma da 4ª Região:
“Agravo de instrumento. Cobrança de multas. Prefeituras Municipais. 1. Não cabe a cobrança de multas incidentes sobre débitos previdenciários das Prefeituras Municipais. 2. Agravo de instrumento improvido.”
6.6. A Súmula 93 de Direito Previdenciário, do TFR e STJ, assim definiu sobre a questão análoga à matéria, ora em questão:
“93 – A multa decorrente do atraso no pagamento das contribuições previdenciárias não é aplicável às pessoas de direito público.”
6.7. A Consultoria Geral da República, em parecer de lavra do Dr. Adroaldo Mesquita da Costa, sob o título Cobrança de multas e mora entre pessoas de direito público – inviabilidade, cita decisão unânime da Egrégia Segunda Turma do Tribunal Federal de Recursos, em julgamento da apelação cível nº 14.168, de São Paulo:
“Às Autarquias, órgãos delegados da União, falece autoridade para exercer poder de polícia administrativa, impondo multas a outras entidades de direito público” (RDP, 5/175).
Conveniente se faz extrair deste mesmo parecer o erudito voto do eminente Ministro Oscar Saraiva, proferido na supramencionada apelação”
“(...) na hierarquia dos privilégios, o da União prefere ao de suas autarquias, e seria inteiramente descabido que uma autarquia, órgão delegado da União, tivesse poderes disciplinares para impor multas a outras pessoas de direito público, o que é manifestação do poder de polícia administrativa” (RDP, 5/175).
6.8. O Prof. Geraldo Ataliba, indagado a este mesmo respeito no XII Curso de Direito Municipal, realizado em Itanhaém, respondeu enfaticamente, asseverando que:
“A multa é sempre uma punição. As entidades públicas não se podem punir umas às outras e, por isso, não pode nenhuma pessoa pública, seja ela autárquica ou pessoa política, pagar multa a outra pessoa pública” (RDP, 21/23).
Face às argumentações que amparam este requerente e, face à carência de objeto, já que resta ser provado nos autos de que o Município de Casa Nova infringiu a Lei Federal 5.194/96, isto é, no exercício de atividades exclusivas dos profissionais protegidos por esta Lei e, face a incompetência do CREA para aplicar multa em outro ente público, conforme já pacificado pela doutrina e pela jurisprudência, requer seja a multa referente ao Processo de Infração Nº 2006027831 tornado sem efeito e, consequentemente, cancelados os lançamentos referentes à mesma.
Nestes Termos,
Pede Deferimento.
Procurador Geral do Município
* Documento elaborado por Nildo Lima Santos. Consultor em Administração Pública.
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