segunda-feira, 4 de agosto de 2008

PRIMEIRO CAPÍTULO - A Primeira Visão das Instituições Militares e da Organização Pública


A partir desta data, editarei, em curtos capítulos, passagens cronológicas de minha vida profissional e que foram, com toda certeza, as bases fundamentais para as análises e críticas que faço sobre a administração pública e sobre o Estado Brasileiro. Passagens com registros históricos no tempo, que darão, com mais facilidade, a percepção ao leitor de como efetivamente foi e é o Brasil Atual, do ponto de vista do seu desenvolvimento orgânico e institucional. A sua evolução verdadeira, tendo como base, alguns aspectos relacionados com algumas instituições, vários setores da administração pública e da sociedade.


*Nildo Lima Santos


Aos dezesseis anos – na fase mais conturbada da vida de qualquer ser humano – onde tudo são aventuras e sonhos eu tinha todos os sonhos possíveis e impossíveis. Era o herói: - que conquistava o mundo; que matava pela moçinha; que beliçosamente se vestia de uniformes militares e combatia os inimigos do Brasil – que eram os mesmos inimigos dos Estados Unidos da América (eram estes inimigos os que o cinema e revistas americanas fabricavam – índios, japoneses, alemães, mexicanos). Se me perguntassem: - Como vivia a minha cidade e, de como funcionavam as instituições públicas? Eu não saberia responder e, nenhum de meus amigos, também, saberiam. Sabíamos: quem era o Presidente dos Estados Unidos, quem era o Presidente da República do Brasil e, que este era Marechal – o Marechal Castelo Branco, que tive a oportunidade de vê-lo de perto quando para mim acenou de dentro do carro quando veio inaugurar a rodovia que liga Juazeiro a Feira de Santana, na Bahia, conhecida como rodovia Lomanto Junior – e, o meu primeiro fascínio pelo Exercito Brasileiro que já era alto, pelo convívio com os meus tios, uns oficiais do Exército e da Aeronáutica e, outros praças graduados da Marinha do Brasil, inclusive um deles que serviu na Força Expedicionária Brasileira e, segundo relatos combateu em Monte Castelo – aumentaram com aquele aceno de mão vindos da maior autoridade do País. Hoje compreendo que aquele gesto tão simples significou muito para mim e, para parte da população deste País em idênticos gestos vindo do maior mandatário da Nação. Era um gesto político sim! Um gesto necessário para a conquista da simpatia no novo papel que o Marechal encarnava por necessidade de seus pares e, da preservação do Estado – mas, estes sentimentos, ficarão para a história e eu os falarei depois, se tiver a oportunidade e a capacidade de entendê-los sem a preocupação das críticas –. Sabíamos quem era o Presidente do Brasil! Sabíamos quem era o Presidente dos Estados Unidos da América! Mas, não sabíamos quem era o Prefeito de nossa cidade e quem eram os Vereadores. As suas responsabilidades, o que faziam, porque e para quem faziam.

O jovem de dezesseis anos, de hoje, não é tão diferente do jovem de quarenta anos atrás. Perguntem-lhes, quem são os seus governantes. Podem até acertar no nome do Prefeito, mais de algum Vereador é mais complicado!!! Agora, perguntem-lhes: Quais são as suas obrigações como eleitores e, quais as obrigações de tais governantes?! Acredito que ninguém saberá dar a resposta. É a resposta que, também, a maioria dos ocupantes dos cargos públicos e políticos não saberão dá-las.

Sabíamos quem eram os Beatles, nome por nome dos que fizeram a Jovem Guarda, quem eram os Rolling Stones e, assim por diante. Mas, não sabíamos o que era básico, fundamental e essencial para a nossa sociedade e o nosso futuro. Tudo eram aventuras e rebeldias.

Com os sonhos dos jovens, irresponsáveis, despreparados e desinformados, mas, querendo vencer na vida. Ser um dia herói, mesmo que fosse para aquele meu mundo familiar – minha cidade, meus amigos, minha família – deixei-me levar pelo fascínio e, insisti para entrar nas Forças Armadas, com apenas dezessete anos, aproveitando a oportunidade de ter no Rio de Janeiro e Brasília meus tios – oficias do Exercito e da Aeronáutica -. E, por ter somente dezessete anos, a oportunidade da realização do meu sonho seria com o meu alistamento na Aeronáutica. O qual se deu em Brasília em 1968. Fiz todos os exames físicos e de saúde, no próprio Ministério da Aeronáutica – na Esplanada dos Ministérios – apresentei alguns documentos, dentre eles a Certidão de Nascimento. Foi somente isto que me exigiram! Não fui submetido a nenhum exame de escolaridade, teste de aptidão, psicoteste ou coisa que o valha, ou qualquer outro que fosse para se saber o nível de qualificação de cada candidato alistado ou sua vocação.

Chegou o dia da minha apresentação e lá fui eu para o Aeroporto de Brasília onde ficava a Base Militar da Aeronáutica. Lá chegando com a mala - já que, supunha-se que aqueles que se apresentassem, seguramente, já deveriam ter início na carreira militar e, de imediato, ficariam alojados na Base Militar – fui colocado em forma (em fila organizada) com os demais alistados sob o comando de um militar graduado ou oficial, cuja patente deveria ser Sargento ou Tenente, o qual nos recebeu com terrorismo psicológico – o que não é recomendável na recepção de jovens e sonhadores que de certa forma necessitam de imenso apoio psicológico em uma fase importantíssima de suas vidas – e, que não é recomendável para a instituição, por irradiar para parte da sociedade a partir deste comportamento - que não deve ser a regra – antipatia, senão medo e precaução. Os meus sonhos então, a partir deste primeiro contacto, que deveria ser de boas vindas, começaram a ruir e a ser remodelados. Só não abandonei tudo a partir daquele momento, porque, naquela situação era refém daquele militar que nos olhava com desrespeito, ironia e galhofa – ele não estava preparado para aquela missão, é a certeza! Culpa do militar?! - Não! Culpa da instituição que não teve o cuidado de prepará-lo para tão nobre missão que seria de boa recepção com boas vindas, ou pelo menos, de transmitir uma boa imagem da instituição pelos que não permanecessem nas suas fileiras. Era o mínimo que se esperava daquele servidor público militar pago com os tributos da sociedade.

Permanecíamos todos perfilados e humilhados, quando, o Comandante da Tropa, já anunciado, como duro e caxias (caxias que é sinônimo de disciplinado, dedicado e ordeiro, numa alusão ao Marechal Caxias e, na caserna, muitas vezes confundido por arrogante, ignorante, truculento, desumano e desrespeitoso) pelo militar truculento e mal preparado que nos humilhava, recebeu o pelotão de candidatos, psicologicamente abalados e desorientados, e passou a fazer a sua preleção. Este comandante com a patente de Coronel, após a preleção de terror, passou então para o processo de seleção dos candidatos para a condição de conscritos (conscrito, na caserna, é o nome que se dá ao iniciante nas Forças Armadas e que ainda não adquiriu a formação militar suficiente para que seja reconhecido como soldado), simplesmente com perguntas com a intenção de obter respostas, sem sequer nos submeter a nenhuma prova de aptidão e conhecimento.
Perguntava o Coronel: - Quem tem carteira de habilitação de motorista?
Alguns respondiam e outros ficavam mudos.
– Vocês que responderam sim, passem para o lado de cá!
E, assim por diante, continuou o Coronel despreparado:
– Quem sabe operar trator Esteira? Passem para o lado de cá!
– Quem é barbeiro? Passem para o lado de cá.
Na minha vez, que seria a vez de quem tinha experiência em datilografia, o Coronel fez a primeira pergunta:
– Quem tem um ano de datilografia? Passem para cá!
– Quem tem dois anos de datilografia? Passem para cá!
Esperei chegar a minha vez. Afinal, eu tinha mais de três anos de datilografia e, tinha tido a oportunidade rara de ter trabalhado em Cartório de Títulos e Documentos. Mas, o infeliz, pelo método errado utilizado me tirou a chance de servir à Aeronáutica como voluntário; e, deve ter tirado a chance de tantos outros jovens sonhadores e que até então, antes daquele evento perverso, acreditavam poder prestar bons e relevantes serviços à pátria. Uns por perderem a oportunidade pelo método adotado e, outros por medo do Coronel e da má recepção para com os mesmos naquela instituição. A recepção que causou espanto e medo. O Exército – tive certeza, alguns meses depois –, não era assim! Era o Exército daquele Marechal que cordialmente acenava para a população. Daquele homem que representava a parte preparada das forças armadas que, assim como toda organização e instituição tem as suas fraquezas. E, a fraqueza daquela instituição (Aeronáutica) estava em parte naqueles militares que, em função do comportamento pouco recomendável para o exercício de funções maiores, não devem ter chegado aos mais altos cargos, ou se chegaram foi por acidente. A recepção daqueles servidores públicos militares que, tenho certeza, não representavam a índole da Aeronáutica, mas, certamente somava negativamente para toda a instituição e para significativa parcela da sociedade brasileira. Esses talvez tenham sido os maiores pecados!

Por sorte, eu era sobrinho de militares das três forças e tinha a consciência de que não eram todos ruins. Meus tios não eram assim! Mas, me ficou a certeza do grande despreparo que era a administração militar da Aeronáutica, naquele momento – pelo menos, daquela Base Militar – e, que veio a se confirmar uns meses depois, no final de meus dezessete anos, quando tive que me apresentar no Exército no Rio de Janeiro – episódio que será narrado no próximo capítulo.

Os episódios narrados neste capítulo nos demonstram o quão é importante a imagem das instituições perante a sociedade para a reciprocidade de respeito mútuo pela conquista e, nunca pela força. O tanto quanto são importantes: - o respeito às pessoas, por mais simples que sejam; - o processo de recrutamento e seleção; - o preparo do profissional para lidar com o público; - a responsabilidade com o que é público; a capacitação profissional; as boas relações políticas institucionais; o processo decisório e de comando; e, o processo de escolha dos comandantes e comandados.


*Nildo Lima Santos. Bel. Em Ciências Administrativas. Pós-Graduado em Políticas Públicas. Consultor em Administração Pública.

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