· Nildo Lima Santos. Consultor em Administração Pública.
O Brasil padece pela falta de concepção conceitual de Estado que lhe garanta a efetividade; e, que é fruto da inflação de normas geradas pelas vias do processo legislativo, por imposição de um sistema autoritário em decorrência do corporativismo da minoria de classes de trabalhadores, empresários e políticos; organizados por sistemas viciados – quanto ao processo de escolha e pela oportunidade patrimonialista –, que apenas se aproveitam do sistema cartorial para as oportunidades de crescimento econômico de seus líderes e dirigentes classistas que somente representam os seus interesses em detrimento do desenvolvimento da sociedade em geral. Portanto, vale tudo! Vale até mesmo a mudança sistemática e rotineira de textos da Lei Maior (Constituição Federal). Desta forma, o Estado não é definitivo e, em razão disto, não se torna efetivo.
As regras básicas para o atual Estado brasileiro, já a partir da Constituição de 1988, são tão somente para o fortalecimento politico do Poder Central da federação, que reside na União. O pouco que se tentou avançar, através dos nossos representantes, com relação ao sistema e seu fortalecimento foi tão somente no sentido do corporativismo. Destarte, o sistema federativo, a todo instante se modifica com as mudanças das regras originariamente estabelecidas para aquele que se pensou quando da instalação da Assembleia Nacional Constituinte de 1988. Já a partir da edição da Carta Maior, iniciarem-se as invasões das competências e, transferência de obrigações sem as correspondentes contrapartidas necessárias, dos e para os entes menores (Municípios) e Estados, partes da federação, apenas para maior concentração de Poder Político dos representantes da União. Diga-se sem medo de erro de avaliação, que as maiores das intenções foram e são as de perpetuação no Poder e, as patrimonialistas – na oportunidade das negociações e negociatas em favor do crescimento econômico dos indivíduos dos grupos do sistema político dominante. Portanto, ao perseguirem estes interesses, a todo instante editam Emendas Constitucionais, Medidas Provisórias e, Leis que destroem o princípio do federalismo em prol dos interesses, ora informados.
A Constituição Federal, se já não era boa, com relação à concepção sistêmica do Estado, passou a ser pior; já que, não existe mais simetria e lógica para a sustentabilidade coerente dos princípios sistêmicos e, dos princípios normativos jurídicos, portanto, de direitos, que permitam a compreensão e a boa gestão da coisa pública. O choque entre si e entre outros de dispositivos das normas – principalmente, da norma maior (CF) – desnorteia todo esforço em prol do desenvolvimento do Brasil. As constatações são inúmeras, mas, que neste momento não são objetos deste artigo. Entretanto, citarei alguns exemplos e, que neste momento são mais gritantes e que nos chamam mais a atenção. São eles:
I - Fixação pela União de pisos salariais para categorias de servidores públicos dos Estados e Municípios, chocando, destarte, com:
a) o artigos 1º e 18 da CF (sistema federativo e autonomia dos entes federados);
b) o inciso X do art. 37 da CF (remuneração definida por lei específica – do respectivo ente federado – e, revisão anual geral na mesma data e ao mesmo índice); e,
c) o art. 39 da CF (fixação de planos de carreira e de padrões de vencimento e remuneração no âmbito de cada competência).
II - Imposição de gasto obrigatório, no mesmo exercício, com o pagamento de professores e profissionais do magistério, ao percentual de 60% do FUNDEB. Conforme dispõem: o art. 22 da Lei Federal nº 11.494, de 2007; e, inciso XII do art. 60 do ADCT à CF; destarte, chocando com:
a) o caput do art. 37 da CF (com relação à obrigatoriedade do cumprimento do princípio da eficiência da administração pública);
b) o inciso X do art. 37 da CF (remuneração definida por lei específica – do respectivo ente federado – e, revisão anual geral na mesma data e ao mesmo índice);
c) o § 8º, I, II e III, do art. 37 da CF (que trata da autonomia gerencial, orçamentária e financeira dos entes federados para dispor sobre controles, critérios de avaliação de desempenho, direitos, obrigações e remuneração de pessoal);
d) o art. 39, §§ 1º, 2º, 3º, 5º, 6º, 7º e 8º, da CF (fixação de planos de carreira e de padrões de vencimento e remuneração no âmbito de cada competência);
e) o art. 169, § 1º, I e II, § 2º, § 3º, I e II, da CF (que limitam as despesas com pessoal); e, ainda, todos da Constituição Federal;
f) com os artigos 47; 48, a) e b); 49 e, 50, da Lei Federal nº 4.320/64 (que estatui normas gerais de Direito Financeiro para elaboração e controle dos orçamentos, que inclui a programação das despesas).
III – Condicionamento da entrega de recursos das receitas tributárias repartidas aos Municípios, conforme dispõe o Parágrafo único, I e II, do art. 160 da CF (condicionamento do repassa à satisfação dos créditos da União) e, artigo 198, § 2º, II e III da CF (limite de aplicação de recursos dos municípios nas ações de saúde); destarte, propiciando toda ordem de chantagem dos agentes da União para com os Municípios, com a imposição do ente maior (União) aos entes menores(Municípios) de débitos astronômicos e contestáveis; sem oportunizar a arguição do contraditório pela falta de transparência e, pela oportunidade da chantagem em razão do imenso poder que os agentes de fiscalização exercem sobre os Municípios; na maioria das vezes, motivados pelo oportunismo para o aumento de ganhos financeiros, por meio de procedimentos, que lhes garantam maiores gratificações. Já que é mais fácil tirar recursos destes do que busca-los através de procedimentos normais junto aos contribuintes, cujos ritos processuais são mais rígidos quanto à satisfação dos requisitos necessários para a configuração dos créditos da União. Basta que o agente fazendário da União suponha a existência do crédito da União, para que, imediatamente, os recursos de determinado Município suspeito sejam bloqueados. Portanto, estes dispositivos, incluídos por emendas constitucionais, desfiguram o sistema federativo brasileiro (artigos 1º e 18 da CF); ao tempo em que, também, negam o direito ao contraditório e, os princípios do planejamento e controle, estabelecidos pelo Direito Financeiro, através da Lei Federal 4.320/64, bem como, fere de morte os princípios da legalidade, legitimidade, razoabilidade e, da continuidade dos serviços públicos.
No caso da fixação dos níveis de vencimentos dos servidores públicos municipais e estaduais, pela União, através de leis por ela editadas, no estabelecimento de pisos nacionais de salários para categorias de profissões com vínculo de trabalho com a administração pública pelo regime estatutário ou especial; é forçoso reconhecermos que estará, este ente maior, interferindo na autodeterminação da sociedade local, não permitindo que os agentes legítimos promovam à auto-organização dos entes menores, cada um, de acordo com as suas condições e meios, conforme definiram as disposições originárias e, que ainda, permanecem na Constituição Federal.
Como se fazer para que sejam cumpridos os limites de gastos com pessoal e encargos; se esta equação fica cada dia mais difícil com a interferência da União, que, no afã de ficar bem com as múltiplas categorias de servidores públicos, comete o erro do tratamento desigual, apenas para a satisfação dos desejos políticos eleitoreiros dos que a representam – desejos estes que na maioria das vezes são originários do corporativismo de determinadas categorias, como ocorre com os professores – ?
É uma pergunta que não pode ser calada. Vez que, é um pergunta que está relacionada à filosofia de um sistema federativo onde possa residir o máximo de coerência e lógica que, a rigor, é originário de sua criação a partir da Assembleia Nacional Constituinte que foi formada por corporativistas, patrimonialistas e, ativistas políticos equivocados quanto à concepção e modelo de Estado que mais servisse como instrumento de democratização das oportunidades em todos os sentidos.
O rompimento do sistema federativo arquitetado originariamente na Constituição Federal, mesmo com suas fragilidades, jamais deveria ser modificado em detrimento das autonomias dos entes menores; sob o risco de acontecer o que estamos vendo hoje, onde governadores e prefeitos em coro – alguns provando do próprio veneno – informam não poderem mais atender as leis federais que estão estabelecendo pisos salariais para os servidores estaduais e municipais, em razão da suficiência de recursos.
Testemunhamos a má intervenção da União por não observar os seguintes fatos: Os Municípios e Estados terão que conciliar as despesas com pessoal ao limite imposto com gastos para este tipo de despesa e, ainda, de conciliar interesses das demais categorias de servidores públicos; que, naturalmente, são incitados a reivindicarem tratamento igual. Por outro lado, os administradores constatam estarem exauridas as oportunidades para atendê-los, em decorrência, da difícil equação, onde a cada aumento de uma determinada categoria (no caso os professores e os profissionais da saúde), mesmo considerando o grande repasse de recursos, compromete a margem de índice que sobrou, dentro do limite legal estabelecido (60%), para este tipo de despesa.
Desta forma, portanto, intencionalmente – criminosamente – ou por incompetência, destrói-se o sistema federativo brasileiro por iniciativa dos Poderes maiores da União (Executivo e Legislativo) e, caminha-se para um Estado unitário.
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