quinta-feira, 15 de março de 2012

OSCIP pode ser contratada pelo rito da Lei 8.666.









* Nildo Lima Santos. Consultor em Administração Pública.




OSCIP pode ser contratada pelo rito da Lei 8.666 é o que confirma o TCE de Sergipe, seguindo pronunciamento do representante do Ministério Público, Procurador-Geral João Augusto Bandeira de Mello.

Em Parecer, referente ao Processo nº 001858/2011, em consulta formulada pelo Município de Umbaúba, o Tribunal de Contas do Estado de Sergipe, informa sobre a possibilidade de OSCIP participar de licitação; nos moldes da Lei 8.666/93 (lei de licitações e contratos), quando da execução de serviços para a administração pública, por Termo de Parceria ou por inexigibilidade de licitação. Donde se conclui, seguindo meu entendimento, já manifestado em artigos publicados neste blog (“OSCIP – Organização Social Civil de Interesse Público” e, ”Participação de OSCIP em licitação pública. Uma sábia decisão do TJ/MG”) que, a entidade com a qualificação de OSCIP pode licitar com a administração pública para, a ela, prestar serviços; desde que, as atividades objeto da licitação estejam dentre as suas finalidades estatutárias, já que, acima de tudo a entidade qualificada como OSCIP é uma associação civil, nos termos do art. 53 do Código Civil Brasileiro. Destarte, contrariando posicionamento da Assessoria Jurídica do TCM Bahia que, em Parecer 5041/11, com graves equívocos interpretativos e, de entendimentos, nega esta possibilidade, inclusive, do direito que goza a entidade detentora do título de OSCIP, prestar serviços à administração pública.

O parecer do TCE Sergipe seguiu o parecer do representante do Ministério Público Especial, Procurador-Geral João Augusto Bandeira de Mello, que assim se pronunciou:

“As Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público – OSCIPs, são pessoas jurídicas de direito privado, instituídas por particulares, sem fins lucrativos, voltadas à prestação de serviços sociais não exclusivos do Estado, sob incentivo e fiscalização deste.

Instituídas pela Lei nº 9.790/99, regulamentada pelo Decreto Federal nº 3.100/99 e Portaria nº 361/99 do Ministério da Justiça, devem as OSCIPs consagrar, em seus estatutos, uma série de normas sobre estrutura, funcionamento e prestação de contas previstas em legislação específica.

Dentre as regras a serem observadas para qualificação de uma pessoa jurídica como OSCIP, destaca-se a prevista no art. 3º da Lei nº 9.790/99, segundo o qual a qualificação somente será concedida a pessoas jurídicas de direito privado, sem fins lucrativos, cujos objetivos sociais tenham pelo menos uma das finalidades previstas em seus incisos, dentre as quais podemos destacar a promoção da assistência social, da educação e da saúde.

E a dedicação às atividades previstas nos referidos incisos configurar-se-á, dentre outras formas, pela prestação de serviços intermediários de apoio a outras organizações sem fins lucrativos e a órgãos do setor público que atuem em áreas afins (art. 3º, parágrafo único).

De acordo com o art. 9º da referida Lei Federal, para o fomento e a execução de atividades de interesse público previstas no art. 3º, o instrumento passível de ser firmado entre Poder Público e as OSCIPs, e o que formará o vínculo de cooperação entre as partes envolvidas, é o Termo de Parceria.

Desta forma, como bem concluiu a zelosa Coordenadoria Jurídica e a digna Auditoria, é perfeitamente POSSÍVEL e LEGÍTIMA a CONTRATAÇÃO de OSCIP, em caráter complementar, por meio da celebração de TERMO DE PARCERIA, para execução de programas nas áreas de saúde, educação e ação social.

Diante da possibilidade de contratação de OSCIP para a realização de serviços nas multicitadas áreas, faz-se necessário analisar a forma pela qual tal contratação deverá ser efetivada.

A Constituição Federal de 1988, em seu art. 37, inciso XXI, exige as obras, serviços, compras e alienações que envolvam a Administração Pública sejam “contratadas mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações”.

Assim, necessitando o Poder Público contratar obras, serviços e bens, deverá mesmo recorrer a um procedimento administrativo estribado nas idéias de competição e isonomia, destinado à seleção da melhor proposta dentre as apresentadas e que possui o duplo objetivo de proporcionar à Administração Pública a possibilidade de realizar o negócio mais vantajoso e de assegurar aos administrados a oportunidade de concorrerem, em igualdade de condições, à contratação pretendida pela Administração. A esse procedimento administrativo dá-se o nome de licitação.

A Lei 8.666/93, Lei de Licitação, em seu art. 24, prevê diversas hipóteses de dispensa de licitação, dentre as quais destaca-se a dispensa “para a celebração de contratos de prestação de serviços com as organizações sociais, qualificadas no âmbito das respectivas esferas de governo, para atividades contempladas no contrato de gestão” (inciso XXIV).

Note-se que a dispensa de licitação está prevista para Organizações Sociais – OS e não para Organizações Sociais de Interesse Público – OSCIP, exige-se a realização de um procedimento licitatório.

Apesar da obrigatoriedade de licitação, diante de situações que inviabilizem a competição, possível será a contratação direta de uma OSCIP, com fundamento na inexigibilidade de licitação, a qual deverá ser formalizada através do procedimento formal de justificação, previsto no art. 26 da Lei 8.666/93.

Cabe ressaltar, ainda, que o ideal seria a realização de concurso de projetos, conforme previsto no art. 23 do Decreto nº 3.100/99, segundo o qual “a escolha da Organização da sociedade Civil de Interesse Público, para celebração do Termo de Parceria, poderá ser feita por meio de publicação de edital de concursos de projetos pelo órgão estatal parceiro para obtenção de bens e serviços e para a realização de atividades, eventos, consultorias, cooperação técnica e cooperação técnica e assessoria”.  

É por esta razão que se opina pela realização de concurso de projetos para a contratação de uma organização parceira, tendo em vista que a realização de um procedimento licitatório propicia à Administração Pública mais vantagens e segurança.

No tocante à classificação orçamentária das despesas decorrentes do Termo de Parceria, como bem informou a ilustre Coordenadoria Jurídica, os repasses a serem feitos à organização parceira deverão ser classificadas como DESPESAS DE TRANSFERÊNCIAS CORRENTES. Opinião esta também compartilhada pela digna Auditoria desta Corte de Contas e pelo Pleno do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais (Consulta de nº TC 809.494 – 24/02/2010).

A despesa com pessoal da OSCIP, pessoa jurídica de direito privado, não se confunde com a despesa com pessoal do órgão estatal. A uma porque os funcionários da OSCIP não compõem o quadro de servidores do ente público parceiro. A duas porque não se está diante de terceirização de mão-de-obra.”

Parcialmente, o parecer do douto Procurador-Geral JOÃO AUGUSTO BANDEIRA DE MELLO, adota a Lei 8.666/93; quando defende a tese de que, a escolha de OSCIP para a celebração de Termo de Parceria sujeitar-se-á a licitação prevista na referida norma, bem como, a esta poderá ser estendida a possibilidade da contratação por INEXIGIBILIDADE DE LICITAÇÃO.  Dentro desta linha, portanto, há de ser reconhecido que, também, a entidade que tenha a qualificação de OSCIP, pode prestar serviços para a administração pública mediante contrato administrativo; pois, a entidade que tem a natureza jurídica de Associação (ONG), não está impedida de exercer suas prerrogativas legais estabelecidas, inclusive, a de prestar serviços a quem quer que seja, objetivando atender às suas finalidades estatutárias, contanto, que se preserve a sua natureza jurídica de associação sem finalidade econômica. Isto é, que não distribua seus excedentes e, seus rendimentos com os seus sócios ou filiados. Entretanto,  quando se tratar de operação na prestação de serviços para o Poder Público, em que seja feita a opção pela transferência de recursos deste referido Poder para a entidade qualificada como OSCIP, na execução de atividades relacionadas com as finalidades listadas no artigo 3º da Lei 9.790;  poderá, tal operação,  ser regulada mediante instrumento contratual denominado de “Termo de Parceria”. E, poderá, também, por opção de transferência de recursos, a entidade na condição de OSCIP, pactuar com o Poder Público mediante o instrumento contratual denominado de “CONVÊNIO”. No entanto, há de ser reconhecido que a pactuação mediante “convênio” obedece a regras distintas e, com diferenças acentuadas das que foram definidas pela Lei 9.790 para o instrumento contratual “Termo de Parceria”. Sendo as regras estabelecidas, para esta última hipótese e modalidade, menos rígida do ponto de vista da aplicação dos recursos;  que, poderão ter a prestação de contas para o seu final e, ainda, quanto ao controle, por exigir a interferência da participação dos Conselhos de Políticas Públicas, respectivos das áreas de atuação que coadunem com as finalidades da destinação dos recursos transferidos, na fiscalização da aplicação destes.
          
Na última hipótese, quando a entidade contrata com o Poder Público, mediante Termo de Parceria; nesta condição e, somente inerente às finalidades pactuadas por este instrumento, a OSCIP se situa na posição intermediária entre as suas prerrogativas como Associação Civil, privada comum; e, como Associação Civil qualificada com o reconhecimento de Organização da Sociedade Civil de Interesse Público, com o gozo de excepcionais prerrogativas e obrigações do Estado, com a hibridez que lhe é própria, e que a coloca bem próxima à fronteira das entidades paraestatais. Mas, tão somente, quando relacionada às formalidades do instrumento contratual, denominado de Termo de Parceria; que não terá as suas finalidades prejudicadas em razão da garantia estabelecida para as entidades reconhecidas como OSCIP, serem obrigadas a destinar o seu patrimônio, quando da sua extinção, para o Estado (administração pública) ou para outra entidade congênere reconhecida e detentora de idêntica qualificação (OSCIP). 
       
É bom que se frise, que a obrigação acessória, da Associação quando reconhecida como OSCIP, não a impede de exercer com plenitude todas as suas prerrogativas como Associação Civil, nos moldes idênticos e permitidos a tantas outras existentes e que estão conforme o artigo 53 do Código Civil Brasileiro.

Acórdão 1021/2007 do TCU, processo nº002.993/2007-5, do Ministro Relator, Marcus Vinicius Vilaça, assim, dispôs:

“15. A redação do artigo traz uma impropriedade, pois Oscip não é espécie de pessoa jurídica. É uma qualificação; pressupõe, portanto, a existência de uma pessoa jurídica, que deve ser, necessariamente, uma das previstas no Código Civil. O IBDCON amolda-se, assim, à figura das associações, que não têm o fito de lucro e constituem-se pela união de pessoas que se organizam para fins não econômicos (art. 53 CC/2002). É, portanto, uma associação que obteve, após solicitação perante o Ministério da Justiça, a qualificação como Organização da sociedade Civil de Interesse Público.”

Conclui-se, portanto, que, contrariamente ao que entende a Assessoria Jurídica do Tribunal de Contas dos Municípios do Estado da Bahia, a entidade qualificada como OSCIP presta serviços e, nesta condição a ela poderá ser estendida as prerrogativas da Lei 8.666/93, que trata das licitações e contratos para a administração pública. E, quanto a isto, não há a mínima razão possível de se pensar a contrário. Apesar da falta de dispositivo explícito com relação à qualificação (OSCIP), mas, que se enxerga em dispositivos da Lei 8.666, especialmente nos seguintes dispositivos: artigo 24, XIII, XX, XXIV e, XXX; caput do artigo 25; e, em particularmente o art. 28, inciso IV, a seguir transcritos:

“Art. 28.  A documentação relativa à habilitação jurídica, conforme o caso, consistirá em:

IV - inscrição do ato constitutivo, no caso de sociedades civis, acompanhada de prova de diretoria em exercício;

A razão é obvia. Se pode a entidade social sem finalidade lucrativa (não econômica) gozar da dispensa de licitação é porque ela pode participar de licitação pública. Portanto, a interpretação dos casos de dispensa de licitação constantes nos incisos do artigo 24 da Lei Federal 8.666 é reforçada com a disposição do inciso IV do artigo 28 que trata da habilitação dos interessados na licitação, com a observação do artigo 27 desta citada lei.

Tomando, ainda, como referência o Acórdão 1021/2007 do TCU, processo nº 002.993/2007-5, do Ministro Relator, Marcus Vinicius Vilaça, encontramos – apesar de titubeante – as seguintes afirmações conclusões:

“9. No entanto, reconheço que a questão não é pacífica. Parece haver, inclusive, certa tendência a se aceitar que elas possam participar de licitações na Administração Pública, desde que a atividade a ser contratada esteja prevista no Estatuto:

                         “Não é que elas não possam ser contratadas. Eventualmente elas podem, se a prestação de serviços e o fornecimento de bens estiver prevista dentre seus objetivos institucionais. Só que, em se tratando de contrato, está sujeito à licitação. Se a Administração Pública aceita contratar Oscip para fornecimento de bens e serviços, tem que haver licitação em que a entidade participe em igualdade de condições com outros possíveis interessados. (Maria Sylvia Zanella Di Pietro, Palestra ‘As Organizações Sociais e as Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público’, proferida no seminário ‘O Ministério Público e a Fiscalização das Entidades Não Governamentais de Interesse Público’, retirada do site do Ministério Público do Estado de São Paulo).”  (grifos e destaques nosso).
 
A única falha do Tribunal de Contas do Estado de Sergipe e, do Procurador-Geral João Augusto Bandeira de Mello é não terem se estendido mais sobre o assunto. Pois, caso se estendessem, encontrariam na Lei Federal 8.666, também, a indicação de que as entidade qualificadas como OSCIP, guardadas as proporções lastreadas nos instrumentos jurídicos normativos, gozam da prerrogativa legal do direito de, também , participarem de licitações públicas para a prestação de serviços à administração pública, desde que – considerando tais proporções –, estejam previstos em seus objetivos ou finalidades estatutárias. 

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