Nildo Lima Santos. Consultor
em Administração Pública
Nestes desconfortáveis dias, pós
eleições para o cargo máximo dos Poderes Executivos e, Poderes Legislativos,
dos entes federados maiores (Estados e União), duas palavras chamaram a minha
atenção, quanto ao que representam no contexto da leitura e, especialmente, no contexto
dos textos e dos fatos que tomaram-nas como apoio à força de excertos das
argumentações a ideias objetos dos mesmos. São as palavras: ANÁTEMA - extraída da argumentação sobre
“A Lei de Responsabilidade Fiscal e o Administrador Público”[1]
e, ENTIMEMA – extraída do texto da
Veja, sobre a “O Lamentável Ano das Falácias - Retrospectiva 2014, ELEIÇÕES,
ECONOMIA”[2]
Os textos, seguem transcritos,
respectivamente:
“A sanção da Lei de Responsabilidade Fiscal,
que “estabelece normas de finanças públicas voltadas para a responsabilidade na
gestão fiscal e dá outras providências”, descortina ampla gama de hipóteses e
compreensão. No atual momento nacional, essa lei vem preencher lacunas
claramente perceptíveis, constituindo um novo quadro de referência para o
gestor público.
A fase inicial de conhecimento da lei tem
propiciado análises por vezes negativas. Vozes críticas visualizam o novo diploma
legal como uma espécie de punição aos ordenadores de despesa, condenando o
texto como potencialmente deletério ao exercício da discricionariedade ínsita
ao cargo público de direção. Emergem os costumeiros anátemas de que a burocratização ou o detalhismo legal
criariam novas dificuldades à gestão administrativa – alegações que, não faz
muito tempo, foram igualmente levantadas contra a Lei n. 8.666/93, de
licitações e contratos, hoje indispensavelmente incorporada ao cotidiano das
organizações públicas.”[3]
(Grifo e destaque nosso)
“ENTIMEMA - É
o argumento em que uma das premissas fica oculta.
O ministro Guido Mantega, da
Fazenda, afirmou o ano inteiro que as contas públicas não sofrem quando o
Tesouro Nacional repassa bilhões ao BNDES ou à Eletrobrás. A afirmação é
falaciosa, a começar pelo fato de que o governo empresa por 3% ao banco e a
estatal o dinheiro que capta oferecendo 11% no mercado. Mas também porque o
ministro da Fazenda vendia a ideia de que se empresta 100 e ficam-lhe devendo
100, então a dívida é zero. Só funciona na versão falaciosa do entimema, pois o ministro
esconde a premissa de que empresta dinheiro de verdade à vista e em troca
recebe uma promessa de pagamento incerta e a prazo.” [4]
(Grifo e destaque nosso)
No primeiro caso, o significado do
vocábulo ANÁTEMA, leva-nos à sua origem na Grécia antiga. “Anáthema” (coisa posta de lado), formada da preposição “aná” (de lado)
mais “tithemí” (colocar). Anátema é uma palavra canônica (relativa às regras da
igreja) que se refere à condenação de uma doutrina contrária a qualquer verdade
do Evangelho de Cristo. Anátema é a expulsão, a condenação, a excomunhão e
execração, do seio da Igreja, de qualquer pessoa que segue doutrina contrária à
verdade da fé católica. Os adjetivos excomungado, maldito e amaldiçoado,
qualificam aqueles indivíduos que condenam o patrimônio da fé católica.[5]
Expressão que tem como sinônimos:
condenação, excomunhão, maldição,
execrado, maldito, opróbio, repreensão e, reprovação.[6]
No segundo caso, o significado do
vocábulo ENTIMEMA, também, ao
levar-nos até Aristóteles, a rigor, leva-nos também à Grécia antiga, aos primórdios
da filosofia e, portanto, dialética por essência nas justificativas e
argumentações construídas pelos símbolos da comunicação linguística das ideias sobre
as concepções e/ou negações de fatos. Sobre este vocábulo, conseguimos,
entender, através do texto compilado da rede mundial de computadores o que
segue[7]:
ENTIMEMA,
significa:
“Forma de silogismo ou argumentação em que
uma das premissas ou um dos argumentos fica subentendido. Na Retórica,
Aristóteles descreve esta disciplina como constituindo uma contrapartida ou um
ramo da dialéctica, à qual se liga porque trata de argumentos que não
pressupõem o conhecimento de qualquer ciência em particular, antes podem ser
utilizados e seguidos por qualquer indivíduo. A função da retórica não é
“persuadir mas discernir os meios de persuasão mais pertinentes a cada caso” (Retórica, IN-CM, Lisboa, 1998,
p.47). Os meios de persuasão são de duas espécies: os extra-técnicos,
como o testemunho, a tortura e as provas documentais, portanto, meios vulgares
que estão à nossa disposição em qualquer momento; os técnicos,
ou seja os meios que necessitam de ser inventados pelo orador. Há três espécies
de meios técnicos: aqueles que se baseiam no carácter do orador (para induzir o
público a formar uma opinião favorável); aqueles que consistem em provocar um
sentimento emocional nos auditores; e aqueles que fornecem
a prova pela mera força do argumento. O terceiro meio de
persuasão é privilegiado e possui duas subespécies: o exemplo (o equivalente retórico da indução) e o entimema (o equivalente retórico do silogismo).
É este último que Aristóteles considera o método retórico por excelência, o
"corpo da persuasão". Devido à sua concisão, o entimema facilita a
expressão do pensamento e pode incluir uma demonstração ou uma refutação.
Por exemplo, os seguintes versos de Alberto Caeiro ilustram a capacidade
demonstrativa do entimema: “O defeito dos homens não é serem doentes: / É
chamarem saúde à sua doença” (Poemas
Completos de Alberto Caeiro, “XIX”, 1914, ed. crítica, Presença, Lisboa,
1994). Este tipo de construção, vulgar na obra de Fernando Pessoa e seus
heterónimos, consagra o tipo de argumento que de obtém pelos contrários, que
muitos retóricos depois de Aristóteles consideram ser a única característica do
entimema. Para Aristóteles, “há duas espécies de entimemas: osdemonstrativos de algo que é ou não é, e os refutativos;
a diferença é igual à que existe na dialéctica entre refutação e silogismo. O
entimema demonstrativo é aquele em que a conclusão se obtém a
partir de premissas com as quais se está de acordo; orefutativo conduz a conclusões naquilo em que se
está em desacordo.” (ibid., p.155).
Quintiliano
e os retóricos latinos avaliam o entimema sobretudo em afirmações sustentadas
ou em argumentações construídas por oposições lógicas. Outra explicação para o
entimema apresentaram os modernos como Boécio, que o entende como um processo
de raciocínio do qual se subentende uma premissa ou a própria conclusão. (Grifo
e destaque nosso)
Mas, o porquê de trazer à baila
tais expressões e, excertos de textos da Lei de Responsabilidade Fiscal e da
Revista Veja?
Para entender a gravidade do que está
acontecendo com o sistema político nacional e as graves consequências ao Estado
brasileiro, já que, as falácias tomaram o lugar das verdades e, o que é
maldito, apróbio e, que deve ser condenado, execrado, condenado e reprovado
deve ser extirpado definitivamente da política brasileira, ao bem da Nação que
é, consequentemente, ao bem da sociedade.
Uma das falácias foi a
sustentação da tese para a destruição da responsabilidade fiscal, quando se
afirmou que, a modificação da meta de “superávit
primário” a ínfimos patamares seria para a garantia do emprego do
trabalhador brasileiro. Então, daí entendermos que, ao tempo em que se
utilizaram da “anátema”, também, se utilizaram da “entimema”, como formas falaciosas para se dá um
novo enredo às intenções dos políticos governantes de então. Destarte,
continuaram a amaldiçoar o controle do estado, através da desobediência à Lei
de Responsabilidade Fiscal, com retóricas e justificativas persuasivas, de modo
a impor discricionariamente as vontades da governante, imperiosamente acima das
leis. Portanto, os amaldiçoados amaldiçoam para se fazer imperar as suas
vontades nas argumentações toscas, mas, amplamente assimiladas – por medo de
não contrariar, ou por cumplicidade – como lógicas e corretas.
[1]
MOTTA, Carlos Pinto Coelho; Jorge Ulisses Jacoby Fernandes – Responsabilidade Fiscal:
Lei Complementar n. 101; Editora Del Rey - Belo Horizonte – 2001; pg. 34.
[2]
PETRY, André – Revista Veja: Retrospectiva 2014: O Lamentável Ano das Falácias
- Eleições, Economia; Veja - Editora Abril: Edição 2406 – ano 47 – nº 53, de 31
de dezembro de 2014; pg. 72.
[3]
MOTTA, Carlos Pinto Coelho; Jorge Ulisses Jacoby Fernandes – Responsabilidade Fiscal:
Lei Complementar n. 101; Editora Del Rey - Belo Horizonte – 2001; pg. 34.
[4]
PETRY, André – Revista Veja: Retrospectiva 2014: O Lamentável Ano das Falácias
- Eleições, Economia; Veja - Editora Abril: Edição 2406 – ano 47 – nº 53, de 31
de dezembro de 2014; pg. 72
[5]
SIGNIFICADOS.com.br – consulta feita na internet, em 18/01/2015, às 16:31hs, no
site: www.significado.com.br.
[6]
Dicionário Online de Português - consulta feita na internet, em 18/01/2015, às
15:29hs, no site www.dicio.com.br.
[7]
E-Dicionário de Termos Literários, de Carlos Ceia – consulta feita na internet,
em 18/01/2015, às 15:00hs. – Site: www.edtl.com.pt
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