terça-feira, 12 de novembro de 2013

CONSÓRCIOS MUNICIPAIS: Figuras jurídicas, ainda, embrionárias e de pouca compreensão



Inácio Loyola. Consultor em serviços públicos
Nildo Lima Santos. Consultor em administração pública


Verificamos que há algumas décadas vem sendo criada uma base legal de leis e regulamentos no país que ampara a sustentação lógica dos consórcios públicos. Suas primeiras publicações ocorreram a partir de 1982. Durante todo esse tempo os marcos regulatórios foram ampliando sua massa de conteúdo num processo evolutivo natural e, provocativo. Em 2005 a lei 11.107 define condições favoráveis a sua implantação como ente federado dando amplos poderes desmistificando as limitações iniciais, por deduções, de sua formação para tratamento de apenas uma das seguintes funções: saúde, educação, infraestrutura, segurança ou outra atividade fim. Ganhando, destarte, nestes novos tempos com a edição de novos instrumentos jurídicos normativos, a convicção da possibilidade de atuação em todos os níveis nas políticas públicas através da gestão consorciada para as múltiplas funções de governo. Enfim, todas ações de conveniência de um dado território pelas suas condições especificas de carências e limitações.

O consórcio ganha o poder da auto sustentabilidade que se pressupõe cobrança de taxas pela execução dos serviços. Essa clareza indiscutível da estrutura legal não se alinha com os critérios de pactuação com os ministérios que até então não estabelecem uma taxa de serviço para os convênios disponibilizados para os consórcios. Para os consórcios convênio de qualquer natureza exige procedimentos formais da administração pública desde licitação, pactuação, fiscalização (acompanhamento), gestão de processos de execução, prestação de contas, etc., independentemente, do tamanho do território, e de suas demandas por serviços públicos. Destarte, para que as ações sejam plenamente viabilizadas, há a necessidade de se reconhecer a existência de custos que não são observados pelos entes convenentes e, em razão disto a autarquia (Consórcio) fica na condição desfavorável; o que é um forte impeditivo para o cumprimento das metas, já que não estão previstos repasses financeiros a título de taxa de administração para o custeio de procedimentos extras – portanto, trabalhos extras – que lhes são obrigados por força do instrumento pactuado.

Importante verificar que os modelos de gestão dos consórcios desmistificam todas as premissas e práticas normalmente adotadas pelos municípios, exigindo planejamento sistemático antes de qualquer projeto para captação de recursos para o território elegendo antecipadamente as prioridades que tenham viabilidade para que se evite desperdícios de recursos com ações não prioritárias e, que já estão devidamente satisfeitas.

Os consórcios como entes federados não recebem repasses direto de qualquer ente público, mantenedor, ou não, da espécie tributo; portanto, as condições favoráveis para a sua sustentabilidade residem na capacidade de darem soluções aos problemas, mas, para tanto, hão de ser remunerados, sejam por preços públicos ou por tarifas. Só assim, então, terá a possibilidade para a excelência na condição da boa prestação dos serviços públicos. É imperioso, portanto, que se tenha uma clara definição quanto ao pagamento dos projetos e serviços que esses organismos devem elaborar e executar para dar soluções institucionais a problemas centenários que não se resolvem de maneira convencional como tem ocorrido. 

Apesar do pensamento que idealizou a lógica dos consórcios quanto a necessidade de ações efetivas embasadas na eficiência, direcionando premissas fortes e verdadeiras para soluções complexas, que os municípios engessados não conseguem efetuar, os consórcios trilham os mesmos caminhos amarrados a concepções conservadoras equivocadas. Essas premissas também começam a ser engessadas pela não compreensão da alta cúpula do governo federal que, também, ainda não entendeu a problemática, desta forma não colocando em discussão geral a condição que possa otimizar a implantação desse novo modelo de gestão inovadora, integrada que permite a sustentabilidade do desenvolvimento regional. Não existe uma definição filosófica que canalize uma ideia central e apropriada para esse novo modelo que veio para solucionar os entraves da administração pública, como uma nova forma de pensamento que deverá sair dos textos normativos escritos e registrados no papel para que efetivamente comece a receber  intervenções apropriadas pelo poder central que, ora equivocadamente vem destruindo inadvertidamente a essência de tais premissas estabelecidas no sistema jurídico normativo pela falta da sua observância na estrutura sistêmica estabelecida.

Observamos que alguns consórcios com mais de cinco (5) anos estão apenas com estatutos que sequer representam os valores instituídos pela lei 11.107 e, se resumem em “inexpressiva condição de uma associação qualquer” que não clarifica seus objetivos. Limitações que impedem pactuações com qualquer ministério. Outros se apresentam com algumas modificações estatutárias para efetuar pactuações especificas que entendemos como um jogo sem regras; consciente apenas do seu início, mesmo sabedores do risco em razão do desconhecimento dos resultados que poderão até implicar em um cenário dantesco onde tudo pode acontecer.

Figura jurídica de consórcios embrionários

Atualmente o governo entrega maquinas para abrir aguadas, melhorar estadas vicinais, efetuar limpeza em poços artesianos etc. Obviamente trata-se de uma atitude louvável. Discordamos apenas da forma, já que o processo está se dando num cenário onde os consórcios não estão plenamente montados, estruturados e prontos para cumprir o seu papel.

Exemplificamos com a seguinte situação de fato e, que ocorreu em um desses Consórcios:

Uma pactuação entre o MDA e o consórcio de Irecê formalizou a condição de implantação de 1.400 cisternas e 200 barreiros de trincheiras em sete (7) municípios do território; as cláusulas do contrato no momento da assinatura regulavam o acordo. Na primeira etapa: construir setecentos (700) cisternas e cem (100) barreiros; na segunda etapa: com quantitativos similares. A contrapartida inicial depositada pelos municípios ocorreu por antecipação credenciando a transferência dos recursos pelo MDA em janeiro de 2012; ficando o recurso bloqueado em virtude da falta de cadastro em banco que só concluiu as formalidades no final de julho de 2012; seguindo-se de pregão para aquisição de materiais e contratação inicial da equipe técnica. Em agosto, iniciaram a seleção dos beneficiários tendo como etapas as seguintes: a) capacitação para beneficiários com exclusão dos que faltassem as reuniões; b) escavações; c) entrega dos materiais; d) construção das cisternas em sistema de mutirão; e) fiscalização e aprovação final. Esse processo desde o início até chegar na sua conclusão exigiu muitas etapas não previstas no instrumento de pactuação, tais como: a) ter o consórcio instalado com todas as suas prerrogativas; b) ter o consórcio equipe técnica capaz de dar encaminhamento as providências necessárias; c) ter a possibilidade de arcar com os custos necessários ao cumprimento dos objetivos pactuados e que não foram computados nas etapas fundamentais e necessárias não previstas na estrutura de custos para a pactuação. Diante destas dificuldades, em dezembro de 2012, somente conseguiram construir 50 cisternas e, dar o encaminhamento dos 100 barreiros trincheiras não concluídos.

Considerando que a ação consorciada exige rigorosamente o envolvimento formal (pactuado por rateio) de vários utentes, não houve, certamente, uma apropriação e divulgação de valores e conteúdos padronizados para que se tornassem claras as evidências acordadas; destarte, tendo cada um dos Municípios utentes efetuado diferentes critérios nos procedimentos formais; a exemplo da segunda contrapartida referentes a salários de coordenadores, gerentes e, outros profissionais que não foram honrados no momento oportuno. Ficando à revelia do conhecimento necessário para as ações comuns que a rigor deveriam ser integradas. A responsabilidade dos atos do Consórcio não se imputará apenas ao seu gestor, já que se trata de responsabilidade que necessariamente deveria e deverá ser compartilhada entre os partícipes que tenha o poder/dever na representação do respectivo ente consorciado e, que foi beneficiário do convênio.

Verifica-se, portanto, que o fortalecimento do Consórcio fica comprometido à medida da não observância aos critérios, que embora comuns, não funcionam quando cada ente tende a efetuar procedimentos, que deveriam ser padrões, de maneiras diferenciadas. Distorcendo, portanto, o sincronismo normativo básico que estrutura a lógica do consórcio.

Outro problema, constatado na exemplificação acima, é que: apesar da criação de previsão legal de entidade reguladora para aquele consórcio, não houve preocupação com sua implantação. Destarte, surgindo como uma figura jurídica estatal frágil e insustentável, dada a situações de vulnerabilidade nos seus sistemas (processos e subprocessos) inerentes aos procedimentos de instrumentalização: jurídico normativo; de planejamento; de organização; de gestão de recursos humanos, financeiros e de contratos; e, de controle e fiscalização. Impeditivos reais para uma boa gestão e, que têm como consequência a reprovação dos atos processuais inerentes aos instrumentos pactuados. Possibilitando, sem sombras de dúvidas, a inclusão do ente devedor (Consórcio), no rol das entidades inadimplentes com a União e/ou Estado, nos seus múltiplos cadastros, dentre os quais, o CALC. Tendo como consequências, ainda – o que é de certa gravidade! –, a inclusão, também, dos Municípios utentes do Consórcio. Desta forma, travados, também, e que se cumpliciam, atrofiando o desenvolvimento regional e da entidade constituída em consórcio que não consegue sair do embrião, em virtude da conjuntura não aportar o conhecimento, vontade, visão ou interesse, necessários para a grandiosidade dessa excelente figura jurídica para suas atividades sustentadas em todos os níveis possíveis de construir.

O consórcio deve ser implantado cumprindo o rito de órgão público com todas as etapas necessárias que lhe assegure a sustentação legal, dentre os quais: estatuto com amplas prerrogativas estabelecidas pela lei; normas técnicas de procedimentos; definição jurídica do vínculo empregatício; plano carreira, cargos e salários; implantação de concurso público; legislação sobre a cessão de pessoal pelos parceiros utentes;  implantação de plano de contas especifico; implantação de sistema de planejamento orçamentário e financeiro; implantação das representações do ente consorciado nos municípios; criação e implantação do ente de regulação e/ou de câmaras técnicas de regulação. Enfim, o modelo exige que as atividades busquem eficiência, eficácia e efetividade em seus processos, onde os profissionais envolvidos sejam técnicos da melhor qualidade, que se defina e viabilize dentro do território as condições ideais para as intervenções públicas e o campo possível de ações compartilhadas.

Ainda, que se efetue estudos de viabilidade técnica econômica e financeira, para a definição na aplicação dos recursos é necessário que as ações sejam consolidadas por contratualizações, dentro dos múltiplos permissivos jurídicos estabelecidos nas normas que norteiam as atividades públicas, dentre as quais, as consorciadas. E, em se tratando de multi-interesses e, conveniências de ordem política e administrativa, há rigorosamente a necessidade que estes sejam intermediados e compatibilizados em função do princípio da “supremacia do interesse público”; e, para isto, torna-se necessário a implantação do ente de regulação onde seja possível, também, a existência do controle social – que é uma exigência legal e, tem origem na nova Carta Constitucional –, como condição essencial para fiscalizar os atos institucionais reguladores das ações pactuadas e/ou disponibilizadas por permissões ou concessões à sociedade em geral.


É oportuno recomendarmos que: as premissas básicas das ações estejam definidas no planejamento com objetivos e metas temporais a curto, médio e longo prazo, permitindo que os novos gestores possam dar continuidade ao processo. E, finalizamos informando que: “– O sucesso ocorre mediante conscientização efetiva de todas as pessoas que de alguma forma devam contribuir para sua grandeza, principalmente a dos utentes detentores da responsabilidade de observar as necessidades e as limitações de cada região”.

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