Nildo Lima Santos.
Consultor em Administração Pública
Sem
muitas divagações teóricas que, muitas vezes induzem o neófito à leitura
jurídica complexa que, ao invés de orientá-lo deixa-o mais ainda cheio de
dúvidas. Portanto, vamos direto ao assunto que se relaciona ao território de
atuação de uma entidade qualificada com o título de Organização Social, nos
termos gerais da Lei Federal nº 9.637 de 15 de maio de 1998 que “Dispõe sobre a qualificação de entidades
como organizações sociais, a criação do Programa Nacional de Publicização, a
extinção dos órgãos e entidades que menciona e a absorção de suas atividades
por organizações sociais, e dá outras providências”. Estes
são os exatos termos da ementa à esta referida Lei.
Há
de ser reconhecido que, a figura da OS, prioritariamente, foi criada para
substituir figuras de entes paraestatais tais como fundações e, até mesmo,
associações criadas na forma do antigo Código Civil Brasileiro e, portanto, com
a intenção de maior controle do Estado para atividades destinadas a tais
figuras jurídicas que, associadas às flexibilidades necessárias, garantissem
maior eficiência e menor possibilidade do uso indevido dos recursos públicos
destinados a tais atividades, já que, as paraestatais existentes
“Fundações e, Associações públicas de
direito privado, existentes e operando para os inúmeros entes federados no
Estado Brasileiro, se perdiam longe do controle direto do ente público
constituidor e, se transformavam em verdadeiros antros de desvios do dinheiro
público e, portanto, responsáveis pelas sangrias e responsabilização direta dos
gestores, cada um pelo respectivos ente federado sob o seu comando e, ao qual
entidade paraestatal se vinculava. É o que informa na sua totalidade, o Capítulo
II da Lei nº9.637, que trata das Disposições Finais e Transitórias, quando, em
diversos dos seus dispositivos extingue Fundações e órgãos públicos da esfera
Federal. Destarte, este referido instrumento legal, através dessas medidas, apenas
substituiu a figura jurídica de determinados entes paraestatais para uma nova
forma jurídica de entes paraestatais, no caso as Organizações Sociais que, do
tipo Associação que, efetivamente com mais clareza, seria reconhecida como
figura jurídica de direito privado e, sujeita às forças do direito civil com a
participação efetiva do ente público em sua estrutura para o estabelecimento de
regras de comando para o adequado ordenamento dos recursos públicos para o
cumprimento das finalidades do Estado nas respectivas áreas sociais de seu
interesse e alcance.
A
Lei Federal das OS além de intencionar a dar soluções para os variados
elefantes brancos acomodados no Estado, também, intencionou trazer para a
administração pública e, sob o controle do estado, as inúmeras instituições
sociais e assistenciais existentes e, que de certa forma, sempre foram
parceiras do ente público, como exemplo, as Santas Casas de Misericórdia,
dentre outras associações que atuavam na área da saúde e, nas áreas da
educação, cultura, pesquisas científicas,
desenvolvimento tecnológico, proteção e preservação do meio ambiente. Destarte,
ensejando a transformação de entidades já existentes para atenderem às regras
do reconhecimento da qualificação como um ente paraestatal e, oportunizando o
surgimento de novos entes paraestatais, dado ao fato da necessidade de maior e,
efetiva participação direta de representantes do ente público no Conselho de
Administração das referidas entidades, no rumo ao cumprimento de suas
finalidades que reconhecidamente são públicas. Destarte, uma vez, criada
qualquer entidade do tipo associação, somente poderá ser reconhecida como OS, se se constata a efetiva participação nesta do
Poder Público fomentador de sua constituição, pois, caso isto não aconteça, a
simples suposição de criação de uma OS que não tenha a participação do ente público
local onde essa foi constituída e tem os seus registros cartoriais, mesmo atendendo
ou não os requisitos de Lei editada pelo respectivo ente federado (União,
Estado, Distrito Federal e Município) não terá vida própria e, caso queira
permanecer no meio jurídico como Associação de direito civil para atuação de
âmbito geral, terá que refazer os seus estatutos remodelando a sua forma de
organização e, promover os devidos registros junto ao Cartório onde tem os seus
assentamentos estatutários registrados e arquivados.
Há
de ser observado que, a condição da concessão da Qualificação de Organização Social
reside no fato de que, a entidade assuma a obrigação do cumprimento de todos os
requisitos da lei nº 6.637, dentre as quais, as de ser obrigada a inserir nos
seus estatutos um percentual de integrantes de representantes
do Poder Público e de membros da comunidade, de notória capacidade profissional
e idoneidade moral, no
seu quadro de membros do Conselho de Administração, órgão de deliberação superior
(Art. 2º, I, d). Ainda, o fato de que, dentre as competências do Conselho de
Administração da OS, estão inclusas, conforme dispõe o Art. 4º e seus incisos,
dentre outras, as seguintes atribuições: a) aprovar a proposta de orçamento da
entidade e o programa de investimentos; b) designar e dispensar os membros da
diretoria; c) fixar a remuneração dos membros da diretoria; d) aprovar e dispor sobre a alteração dos
estatutos e a extinção da entidade por maioria, no mínimo, de dois terços de
seus membros; e) aprovar o regimento interno da entidade, que deve dispor, no
mínimo, sobre a estrutura, forma de gerenciamento, os cargos e respectivas
competências (Art. 4º, III, IV, V, VI, VII, VIII, X). Destacamos o dispositivo
(Art. 4º, IV e VI) que dispõe sobre a designação e destituição dos membros da
Diretoria e, sobre a aprovação, alteração dos estatutos e, extinção da
entidade. Ora, se, para a simples tarefa de constituição da entidade OS há a
necessária concordância de dois terços, no mínimo e, ela somente poderá ser
reconhecida com a participação de representantes do Poder Público (Entende-se
por Poder Público, a figura jurídica do próprio Estado), conforme disposto na
alínea “a” do inciso I, do Art. 3º, da lei em referência, entende-se portanto,
que o ente estatal é o principal agente para a própria vida e existência da
entidade. Em outras palavras: E, clareando o tema, Poder público: é o conjunto dos órgãos com autoridade para realizar os
trabalhos do Estado, constituído de Poder Legislativo, Poder Executivo e, Poder
Judiciário. Em sentido amplo, representa o próprio governo, o conjunto de
atribuições legitimadas pela soberania popular. Isto é, o próprio Estado, sem
tirar nem por.
Destarte, os
atos constitutivos da entidade terão que ter a participação direta – por
adesão, ou por provocação deste – decisiva para que seja possível a existência
da intenção de se constituir a entidade para a justa qualificação como OS – a
qual a rigor, já nasce ou renasce para ser OS – para as finalidades definidas
pelo próprio ente público em função de seus interesses. Destarte, estar-se-á
falando e, deverá ser reconhecido, em um novo modelo de ente paraestatal para
substituir os que outrora causavam embaraços à administração pública que, ao
invés de dar soluções passaram a ser problemas. E, como ente paraestatal a
exigência real é de vinculo a um determinado ente federado e, sujeito às regras
gerais da Lei Federal nº 9.637, com as variações que não conflitarem com esta,
dada por lei específica sobre a matéria, editada pelo respectivo ente federado
à qual se vinculará o ente estatal reconhecido e qualificado por ele como OS.
O disposto no inciso VI do artigo 4º da
Lei 9.637 combinado com os: Art. 2º, I, “d”; Art. 3º, I, “a” e “b”, III, nos
certificam da natureza jurídica da OS como uma figura dependente do ente
público com o qual mantém vínculo e, portanto, está caracterizado ser uma
figura eminentemente paraestatal que, sendo integrada pelo respectivo ente
público, somente poderá atuar onde existir o nível de competência de tal figura
jurídica, no caso, restrito ao seu próprio território. E, em não mais sendo
aceita a continuidade de participação do ente público constituidor na entidade
(OS) essa desaparecerá, considerando, os seguintes fatos: a participação do
colegiado (Conselho de Administração) em mais de 50% dos domiciliados no
respectivo ente federado, seja tantos os que estão na qualidade de
representantes do Poder Público quanto os que estão na qualidade de representantes
de entidades da sociedade civil – portanto, de representantes da própria
comunidade, conforme se extrai da alínea “d” do inciso I do Art. 2º da Lei nº 9.637
–, reconhecendo-se, destarte, que a decisão de se manter a vida da entidade
está estritamente vinculada à sociedade que permitiu a sua criação que se
restringe aos respectivos moradores de determinado ente federado e, respectiva
aceitação de representantes destes junto ao ente federado com a legitimidade e,
o poder/dever de decidir sobre a administração local com a independência e
autonomia que reconhece neste. E, considerando que, é a comunidade local que
sempre terá a exclusividade para a formação dos dois terços decisivos para a
vida da associação. E, deverá, ser considerado, ainda, a importância e, o fato
de tais representantes terem a qualidade de serem membros natos na constituição
da entidade. E, é esta exclusividade que, fortalece o conceito de ente
paraestatal. E, se é paraestatal ao estado pertence e, a ele se vinculará em
sua esfera real de competência que não se extrapolará dos raios de seu
território político/geográfico e jurídico no âmbito de atuação reconhecido pelo
ente federado ao qual está vinculado. Conforme extraímos da Lei nº9.637 que,
não dá brechas a outras interpretações, considerando a filosofia de sua
concepção e, os exatos termos dos seus dispositivos pela interpretação
teleológica e, especialmente, da lógica sistemática (sistemológica), cujos
dispositivos principais, colamos “in verbis”:
"Art. 2o São requisitos específicos para que
as entidades privadas referidas no artigo anterior habilitem-se à qualificação
como organização social:
I - comprovar o registro de seu ato constitutivo, dispondo
sobre:
d) previsão de participação, no órgão colegiado de deliberação
superior, de representantes do Poder Público e de membros da comunidade, de
notória capacidade profissional e idoneidade moral;
Art. 3o O
conselho de administração deve estar estruturado nos termos que dispuser o
respectivo estatuto, observados, para os fins de atendimento dos requisitos de
qualificação, os seguintes critérios básicos:
I - ser composto por:
a) 20 a 40% (vinte a
quarenta por cento) de membros natos representantes do Poder Público, definidos
pelo estatuto da entidade;
b) 20 a 30% (vinte a trinta
por cento) de membros natos representantes de entidades da sociedade civil,
definidos pelo estatuto;
III - os representantes
de entidades previstos nas alíneas "a" e "b" do inciso I
devem corresponder a mais de 50% (cinquenta por cento) do Conselho;
Art. 4o Para
os fins de atendimento dos requisitos de qualificação, devem ser atribuições
privativas do Conselho de Administração, dentre outras:
III - aprovar a
proposta de orçamento da entidade e o programa de investimentos;
IV - designar e
dispensar os membros da diretoria;
V - fixar a remuneração
dos membros da diretoria;
VI - aprovar e dispor sobre a alteração dos
estatutos e a extinção da entidade por maioria, no mínimo, de dois terços
de seus membros; (destaque nosso)
VII - aprovar o
regimento interno da entidade, que deve dispor, no mínimo, sobre a estrutura,
forma de gerenciamento, os cargos e respectivas competências;
VIII - aprovar por
maioria, no mínimo, de dois terços de seus membros, o regulamento próprio
contendo os procedimentos que deve adotar para a contratação de obras,
serviços, compras e alienações e o plano de cargos, salários e benefícios dos
empregados da entidade;
X - fiscalizar o cumprimento das diretrizes e metas definidas
e aprovar os demonstrativos financeiros e contábeis e as contas anuais da
entidade, com o auxílio de auditoria externa."
CONCLUSÃO:
Não
nos sobram dúvidas de que a OS (Organização Social) para que seja constituída
depende da anuência e autorização do Poder Público que, fomenta a sua criação e
participa de sua constituição em atos constitutivos e conhecidos como Estatutos
Sociais da entidade. E, de que, assim também, depende da participação decisiva
para sua criação e, manutenção, de representantes da sociedade organizada local
e, com participação efetiva como membros filiados de instituições civis
devidamente registradas e constituídas na forma da legislação aplicável (Código
Civil Brasileiro) e sediadas no ente federado respectivo onde se localiza e tem
registro a OS. E, em sendo assim, as suas ações limitam-se ao respectivo
território do ente federado que fomentou a sua criação e, a ele está vinculada
como ente paraestatal.
Poder-se-á,
então, admitir-se que, a OS (Organização Social) mesmo vinculada a determinado
ente federado poderá contratar com outro ente federado. - Ledo engano!!! A
figura paraestatal serve tão somente ao ente para o qual foi criada; não
existindo a possibilidade de mágicas para que essa sirva a outros entes
federados. Poderá até se supor que, através de mútua colaboração em acordos
celebrados, individualmente, entre estes, com a aprovação de Leis específicas,
de cada ente federado, onde a critério do poder legislativo poderá ser concedida
a autorização para a tal celebração do acordo específico. Mas, mesmo assim, não
será possível através da OS, vez que, estar-se-á desvirtuando a sua natureza e
a filosofia de sua própria existência que reside na exigência de assim atuar
somente onde for qualificada na condição de OS que não poderá ser anulada por
ser característica essencial à vida própria da entidade e, que, rigorosamente
consta de seus registros junto ao Cartório. E, diferentemente, de outros tipos
de Associações constituídas nos moldes do Código Civil Brasileiro, já que se
trata de uma organização paraestatal e, que para que atue deverá contar com a anuência
da sociedade local que é representada na entidade por membro dela originário com
mandato nato junto ao Conselho de Administração, cuja finalidade maior é a de
envolvimento desta dita sociedade local na vigilância e aplicação dos recursos
públicos sem a fuga de suas finalidades. Garantias estas que se perdem quando
se trata de interesses de outras comunidades senão as que representa. Evidentemente,
seria ressuscitar a mesma natureza indesejável das antigas Associações e
Fundações públicas que motivaram a criação da figura jurídica OS. Figura
jurídica, sim! Já que ao perder essa qualidade deixará de existir, mesmo como
associação, conforme demonstrei aqui nestas análises – portanto, uma nova
figura paraestatal, por estar mais para o Estado e, dele depender diretamente
para a sua sustentabilidade como figura jurídica!
E,
os que advogam em favor da possibilidade de se admitir a contratação de uma OS
para serviços destinados a um ente federado que não seja o seu instituidor e/ou
para diferentes entes federados através de Consórcios Públicos revestidos como
autarquias ou simples associações públicas, lamento dizer que estão
completamente equivocados, já que, estar-se-á, tanto ferindo a real natureza da
OS (Organização Social) como figura paraestatal e, cerceando a participação das
sociedades locais neste tipo de organização e, ainda, da possibilidade de a
sociedade participar diretamente das providências e fiscalização de atividades
que a elas interessam diretamente, dentro de suas peculiaridades, no cumprimento
da exigência do controle social (Art. 20, III da Lei nº 9.637). Destarte, a
negação da participação de cada sociedade local, naquilo que lhes diz respeito:
à percepção de suas carências e da necessidade da mobilização de esforços para
a solução mais adequada das mesmas, que passam pela certeza de que os recursos
públicos destinados ao respectivo ente federado serão efetivamente bem
aplicados em prol da sociedade local. O que não será possível tal
acompanhamento e fiscalização com a impossibilidade desta em participar das
operações geridas por OS (Organização Social) que tem sob seu comando
representantes de outro entre federado e, que é aquele que o constituiu.
Portanto, não existem as garantias de que os recursos serão devidamente
aplicados com a transparência necessária, já que, não tem nada a ver com a comunidade
do ente federado instituidor da OS. Destarte, abrindo-se flancos para a volta
dos problemas que outrora existiam e que foi dada a oportunidade da correção
pelas novas paraestatais OS e, não para que estas venham a agravar a situação
anterior, contribuindo, destarte, para a ampliação dos mesmos descaminhos de
antes.
Finalmente,
há de ser considerado que a OS, nesta qualidade – e, essa é tão somente a única
qualidade que deve existir! –, somente poderá atuar no ente federado que a
qualificou e, portanto, àquele que tem a prerrogativa para com ela celebrar
Contrato de Gestão e/ou Termo de Fomento ou de Colaboração. Estes últimos
criados pela Lei Federal nº 13.019, de 31 de julho de 2014, que ainda não está
em pleno vigor, conforme dispõe o seu artigo 88.
Salvador,
BA, em 18/04/2015
Bibliografia:
- Constituição Federal de
1988.
- Lei Federal nº 9.637, de
15 de maio de maio de 1998.
- Lei Federal nº 13.019,
de 31 de julho de 2014.
- Código Civil Brasileiro
(Lei Federal nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002.
- Caderno Jurídico: As
organizações Sociais e as Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público
– Apresentação: João Francisco Moreira Viegas – Coordenador do Centro de Apoio
Operacional das Promotorias de Justiça da Cidadania - São Paulo – SP. Acessado
internet em 12/04/2015.
- Lei Federal nº 11.107,
de 06 de abril de 2005.
- DI PIETRO, Maria Sylvia
Zanella. Direito Administrativo. São Paulo: Atlas, 1994.
- JUSTEN FILHO, Marçal.
Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Saraiva, 2005.
- MEIRELLES, Hely Lopes.
Direito Administrativo Brasileiro, 22ª edição, São Paulo, 1997.
- SILVA, De Plácido e.
Vocabulário Jurídico. Rio de Janeiro: Forense, 11ª Ed., 1994.
PT.wikipedia.org/wiki/Poder. Acessado em 18/04/2015.
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