sexta-feira, 10 de fevereiro de 2017

Desenvolvimento Municipal x Crise e Perspectivas. Palestra de setembro de 1993. Diagnóstico perfeito









Nildo Lima Santos. Consultor em Administração Pública. Secretário de Planos e Desenvolvimento do Município de Juazeiro, à época. Pós graduado em Políticas Públicas e Gestão de Serviços Sociais.




I – ASPECTOS CONCEITUAIS DO DESENVOLVIMENTO

A visão de desenvolvimento municipal pela ótica simplista através de grandes investimentos de capital fixo, que indica o grau da grande indústria é um tanto distorcida e antagônica; pois, a transferência do trabalho operário para o capital, sob a forma de máquinas, desvaloriza a força do trabalho vivo devido a essa transferência. O que era atividade do trabalhador, portanto, atividade humana, torna-se atividade da máquina.

À medida que se desenvolve a economia baseada na grande indústria, a criação de riquezas depende cada vez menos do tempo de trabalho e da quantidade de trabalho humano utilizada, e cada vez mais do poder dos instrumentos mecânicos postos em movimento durante a duração do trabalho.
O roubo do tempo de trabalho de outrem que assenta a riqueza atual, surge como uma base miserável relativamente à base nova, criada e desenvolvida pela própria grande indústria.

O desenvolvimento poderá ser visto, ainda, sobre os aspectos da segurança e do bem-estar.

O dilema do bem-estar e da segurança, mantêm estreitas relações com a promoção do desenvolvimento econômico. O desenvolvimento e a segurança são ligados por uma relação mútua de causalidade. De um lado a verdadeira segurança pressupõe um processo de desenvolvimento quer econômico, quer social. De outro o desenvolvimento econômico e social pressupõe um mínimo de segurança e estabilidade das instituições.

A disciplina do desenvolvimento pressupõe a garantia de uma rígida segurança institucional.

A expansão demográfica é um dos fatores de interveniência no processo de desenvolvimento de um povo. O crescimento demográfico inversamente proporcional ao crescimento econômico da população, implica em graves problemas sociais geradores de cinturões de miséria nas periferias das zonas urbanas das cidades. Somente através de programas econômicos que atendam a uma razoável distribuição da renda se é possível o desenvolvimento harmônico e integrado de um povo.  

II – CRISES E FATORES LIMITANTES DO DESENVOLVIMENTO MUNICIPAL

II.1. A crise política institucional;
II.2. A crise econômica financeira;
II.3. Carência de recursos humanos adequados (crise de competência);
II.4. Inadequada estrutura administrativa e falta de instrumentação legal;
II.5. Desconhecimento dos agentes políticos (prefeitos, secretários e vereadores) do papel fundamental do Município como ente-federado;
II.6. Inobservância das funções planejamento e controle na administração pública;
II.7. Supercentralização dos poderes.

II.1. A Crise Política Institucional

A crise política institucional é uma das maiores responsáveis pelo entrave no desenvolvimento municipal. A princípio o próprio sistema de governo é contestado por grande parcela da população pois, tem sido inócuo dentro da sua formalização que atende, precariamente, os interesses de parcela da burguesia – reconhecida assim apenas pela tradição do emprego da palavra – que ora se vê alijada do processo de acumulação do capital em benefício da burguesia imperialista do primeiro mundo. Principalmente a norte americana.

O próprio sistema político eleitoral carece de reformas profundas, exatamente por permitir as más práticas de conquistas nas mais diversas áreas da sociedade, onde sempre prevalece o jogo do poder dos detentores do capital, não importando as origens dos mesmos. O que isto permite é exatamente a cumplicidade dos poderes governamentais: Executivo, Legislativo e Judiciário que, no domínio da sociedade, adotam regras antissociais visando o crescimento desse grupo dominante para a auto-sustentação dos indivíduos que o forma, e consequentemente culmina com a sustentação do sistema de governo do interesse dos países capitalistas e imperialistas que o mantem para atender aos seus interesses e das nações dominantes.

O cerne do problema está na formação cultural do indivíduo que é a unidade de sustentação de todo e qualquer sistema a partir da escolha dos seus representantes políticos em todos os níveis da federação, especialmente, no âmbito municipal. Está, também, por consequência, nos vereadores, prefeitos, vice-prefeitos e demais agentes políticos representantes de parcela da sociedade do Estado.

Os exemplos da degradação das instituições públicas e privadas estão aí à mostras, em todos os momentos da vida do povo brasileiro. São policiais, juízes, advogados, políticos fazendo parte de quadrilhas e tráficos de influências e de drogas.

São políticos eleitos na compra do voto e pelo império do dinheiro sujo do tráfico de drogas e de influências. É o império da imprensa e dos meios de comunicação na chantagem através de diversas formas. Neste caso, este exemplo está bem aqui perto da gente onde são sentidas as maiores formas de pressão através da mentira e dos que se aproveitam da liberdade de imprensa confundindo-a com liberdade para calúnias e difamações. Daqueles que se aproveitam das grandes falhas da justiça para as chantagens fartas nas provocações e nas mentiras fáceis.

JOSEPH GOEBBELS ao orientar o sistema nazista comandado por HITLER, sabidamente já adotava a mentira como forma de domínio da opinião pública e dizia: “Minta, minta... o máximo quanto puder sobre os seus adversários que, sempre no final sobrarão resquícios de verdades.”

Vaticinou, ainda, SHAKESPEARE: “Estou esperançoso de que com o maciço desenvolvimento das comunicações poderemos viver num mundo em que o livre acesso a mente das pessoas, em toda parte, nos possibilitará a realizar os nossos objetivos por meio da competição de ideias, em lugar das pressões dos armamentos e da força.”  
  
Eis, pois, que a combinação destas duas afirmativas propiciam toda espécie de alienação do homem em benefício do domínio do capital, alheio a toda e qualquer escala de valores, inclusive com a inversão e a subversão de tal escala.

II.2. A Crise Econômica Financeira

A crise econômica financeira é também, um dos fatores limitadores do desenvolvimento municipal. Ao nosso ver não é a cousa e sim, a consequência da política de domínio psíquico social através das mais variadas formas, inclusive, pela cultura ianque e dos demais países imperialistas capitalistas, somadas aos pensamentos e práticas contrárias e extremistas da esquerda que negam o capital, na sua forma pura e benéfica para o desenvolvimento da sociedade humana, que de seu turno, tem os comandos pelo imperialismo mais perverso, ainda, do socialismo de visão estritamente ao derredor do comunismo.

A crise econômica financeira dos países latinos americanos foi por demais agravada pelas intervenções imperialistas através de golpes palacianos ou armados e pelas intervenções do FMI. Na verdade o imperialismo é um sistema político econômico de dominação envolvendo principalmente o excedente econômico produzido pelos países dependentes. Para consolidar-se como sistema de relação, o imperialismo pode assumir ou revelar manifestações ideológicas, militares, culturais, religiosas, sociais. Em qualquer desses planos podem manifestar-se formas especiais de alienação que levam o país a grandes perdas internacionais. Estas perdas afetam drasticamente a economia nacional, causando como consequência o grande sucateamento das industrias do país e o grande caos, social, sentido em cada ente-federado que, basicamente sobrevive precariamente deste ciclo econômico que lhe propicia receitas tributárias transferidas, repartidas e próprias.

Além do entrave no desenvolvimento municipal provocado pelo sistema econômico de dominação imperialista, temos mais próximo, o desleixo e a incapacidade dos municípios para o gerenciamento do dinheiro público. A incapacidade de o município implantar plenamente o seu sistema é patente em cerca de 90% dos municípios brasileiros. Então, é discutível a autonomia constitucional relativa às finanças públicas dada aos municípios como também, fica bastante claro que o sistema tributário nacional carece de uma reforma profunda para que realmente venha a servir como fator de desenvolvimento da União, através da priorização das ações potenciais econômicas regionais, onde seja levado em consideração o consumo interno.

Politicamente, os municípios poderiam ter parte dos seus problemas resolvidos através do bom gerenciamento das suas verbas que foram transferidas do FPM e do ICMS, a começar por entender que a Prefeitura (Poder Executivo) é a maior empresa do município e carecedora de práticas racionais, legais e científicas de desenvolvimento e organizacionais. A exemplo a criação de um quadro de pessoal bem qualificado e através do sistema do mérito por concurso público. Através do investimento de parte dos repasses financeiros na área de infraestrutura física e urbana, aliadas às ações de desenvolvimento econômico, imprescindíveis para a captação de investimentos que fatalmente culminarão com a geração de emprego e renda.

Temos observado grandes restrições ao desenvolvimento municipal, causadas pela falta de uma política tributária do Estado, adequada para as cidades de fronteira, ainda aos péssimos serviços públicos prestados pelas concessionárias de serviços públicos de eletricidade e de água e esgotos que afugentam investidores.  
      
II.3. Carência de Recursos Humanos Adequados

Os Municípios, há longos anos, têm sido ineficientes na prestação dos serviços públicos. O empreguismo e o nepotismo usado para se fazer política tem se caracterizado uma afronta às normas legais e um grande desperdício de recursos financeiros, consequentemente, contribuindo para o atraso do País.

A base jurídica de um município têm que ser perfeita para que se evite controvérsias trabalhistas prejudiciais à administração pública e que se evite os caprichos dos administradores onde prevalece o personalismo e a liberalidade que é um dos fatores de degeneração da estrutura organizacional e, permissivos, para a corrupção generalizada dos próprios servidores no domínio de determinados cargos em conluio com os políticos de turno.

É necessário que o Município exerça a sua plena autonomia constitucional com relação à sua auto-organização e a organização do regime jurídico dos servidores. É necessário, portanto, que os artigos 37 e 39 da Constituição Federal sejam plenamente aplicados, inclusive, para resguardar o Município das ingerências do Estado e, muitas vezes descabidas, da União através dos órgãos federais (INSS e CEF).

II.4. A Inadequada Estrutura Administrativa e Falta de Instrumentação Legal

O definhamento das organizações muitas vezes está na sua concepção ou na sua estrutura administrativa mal definida. Uma superestrutura muitas vezes não é conveniente para toda uma realidade Municipal. Poderá ser, através do gigantismo, assim como é o Estado Brasileiro, uma grande razão para o desperdício de recursos e, consequentemente, para o atraso da sociedade. Também, um microestrutura com poderes centralizados na mão do Prefeito e pequeno número de pessoas, é da mesma forma, uma grande razão para o desperdício do dinheiro público, com a agravante de transformar a coisa pública em propriedade particular.

O princípio da descentralização, além de ser uma exigência legal, é também, uma exigência racional para o desenvolvimento organizacional.

Uma estrutura administrativa jamais deverá ser copiada, pois, as realidades de cada município não são totalmente iguais, vez que, diferem em razão dos potenciais econômicos e no comportamento sócio cultural da população. Isto é, do povo que habita o Município.

Mais de 90% dos municípios nordestinos têm estrutura organizacional inadequada e, no entanto, os gestores públicos não se apercebem desta nefasta realidade e onde para eles, o profissional mais importante é o contador. Lembramos que nessa atitude está a forma mais rápida da transferência da coisa pública para particulares, inclusive com avais perfeitos de inspetores dos tribunais de contas, do sistema judiciário, do Poder Legislativo e de grande parte de instituições públicas e privadas que se cumpliciam com o sistema corruptivo a trôco de favores acordados, em detrimento do desenvolvimento nacional.

Aliado a esse fator, ora citado, acima, está a falta de instrumentação legal, o que propicia, destarte, grandes desvios e perdas do dinheiro público. Principalmente pela invasão dos órgãos federais de fiscalização no ente federado município e, pela irracional administração financeira do mesmo. É muito importante para os gestores inescrupulosos, a manutenção da desorganização exacerbada porquê eles se eximem de culpas jogando-as no próprio sistema, que nada fizeram para muda-lo.

II.5. Desconhecimento dos Agentes Políticos (Prefeitos, Vice-Prefeitos, Secretários e Vereadores) do Papel Fundamental do Município Como Ente-Federativo

Desconhecem, os agentes políticos, a forte autonomia que foi atribuída aos municípios através da Constituição Federal, chegando a equipará-los com as demais Unidades Federadas, Estados, Distrito Federal e União.

A autonomia é muito forte nos aspectos ligados às prerrogativas de instituir e arrecadas os tributos de sua competência, bem como, de aplicar suas rendas: organizar e prestar, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, os serviços públicos de interesse local, incluído o de transporte coletivo, promoção, no que couber, do adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano; e a instituição de regime jurídico e plano de carreira para os servidores do municipais, da administração direta, suas fundações e autarquias.

O desconhecimento dessa autonomia, ou a falta de efetividade de ações jurídicas/administrativas para que o Município se prevaleça como ente-autônomo, leva-o, inevitavelmente, a uma série de transtornos permitindo com isto a forte dependência do ente-federado aos favores de grupos políticos mais estabelecidos, evidentemente, em outros entes federados maiores. Em outras palavras, nós diríamos que o Município renuncia aos seus direitos políticos e jurídicos para o benefício de meia dúzia de mandatários, em detrimento do desenvolvimento da sociedade.

II.6. Inobservância das Funções Planejamento e Controle na Administração Pública

O planejamento público tem a dimensão Técnica Política. Técnica porque implica o domínio de uma metodologia de trabalho própria, a produção e o acesso a informações atualizadas, sistematizadas e agregadas no nível adequado às necessidades e, frequentemente, o apoio dos conhecimentos especializados de profissionais de diferentes áreas. Política porque é antes de tudo, um processo de negociação que busca conciliar valores, necessidades e interesses divergentes e administrar conflitos entre os vários segmentos da sociedade que disputam os benefícios da ação governamental.

A dimensão técnica levada ao extremo tende a distanciar o planejamento e os interesses da população. Abrir um abismo entre planejamento e execução é permitir, por exemplo, que grupos de técnicos isolados em gabinetes venham a elaborar diagnósticos públicos; e a formular soluções que lhes pareçam mais adequadas, sem qualquer consulta aos demais interessados na ação governamental. O predomínio desse comportamento, excessivamente voltado para aspectos técnicos, é próprio dos governos autoritários e típico daquele sistema que modernamente denominamos de tecnocracia.

A ênfase exagerada da dimensão política, por sua vez, poderá levar o planejador a propostas demagógicas ou paliativas, não encaminhando soluções para os problemas públicos.

Na verdade a maioria dos municípios brasileiros sequer adotam a forma rudimentar do planejamento, imperando o imediatismo e os caprichos de dirigentes autoritários e centralizadores que enxergam como função básica da administração pública apenas o assistencialismo e o empreguismo.

Os municípios onde nos últimos anos, foram administrados por técnicos, o desenvolvimento foi bastante acentuado, ao inverso, naqueles em que prevaleceram as propostas políticas demagógicas e o assistencialismo, o atraso está às vistas.

Um dos instrumentos técnicos de planejamento é o orçamento municipal que é pouco entendido pelos governantes que o faz simplesmente para o cumprimento das leis, fazendo-o inadequado e executando-o das formas mais incorretas possíveis.

Também, a inobservância da função controle, assim como a inobservância da função planejamento, é uma forte condicionante ao desenvolvimento ou ao atraso.

A função controle é a principal função exigida para a administração da coisa pública, porque é através dela que o gestor público se vê policiado para o cumprimento real dos objetivos públicos. Quando essa função é insuficiente ou inexistente, inevitavelmente teremos o caos na sociedade, pois as verbas públicas deixam de ser aplicadas em benefício do desenvolvimento da sociedade e são tão somente aplicadas no crescimento econômico e político de pequenos grupos de domínio.

Os responsáveis por este controle, os servidores públicos, a Câmara Municipal de Vereadores, o Tribunal de Contas dos Municípios, as instituições políticas e instituições civis, quando se ausentam desse controle ou se eximem dessa responsabilidade, tornam-se corresponsáveis pelo caos e até mesmo cúmplices, no caso dos vereadores e do Tribunal de Contas dos Municípios, através dos seus agentes.

O desenvolvimento só virá quando toda a sociedade se conscientizar de que o controle das ações públicas está em suas mãos através do exercício da cidadania – o controle social – sem os medos e culpas que os grupos dominantes imputam.

II.7. Supercentralização do Poder

A supercentralização do poder, além de ser um afronte aos princípios legais de administração pública, é, também, uma forma mesquinha e egoísta de se administrar o que é público.

Um município só se desenvolve socialmente e economicamente a partir do princípio da implantação da descentralização do poder, onde o gestor público passa a dirigi-lo com os seus auxiliares: Secretários e demais técnicos e servidores com cargos e funções específicas de comando e supervisão definidas por Leis, Regulamentos e Regimentos.

A maioria dos Municípios do Norte da Bahia e Nordeste, não adotam este princípio e, os que têm um corpo de secretários, os têm apenas como meras figuras decorativas e onde sempre predomina o empreguismo na troca de favores e/ou conveniências no agrado dos parentes dos governantes, o que é uma prova cabal da irresponsabilidade com a coisa pública, além, a falta de compromisso com o que é público e, por ser público tem o caráter impessoal. Nestas horas é que faz falta a função do controle para fazer com que o gestor cumpra o seu verdadeiro e legítimo papel no poder/dever das providências para o bem estar da sociedade em geral e, efetivamente, sempre com o foco no princípio “da Supremacia do Interesse Público”.  

III – PERSPECTIVAS DO DESENVOLVIMENTO MUNICIPAL

As perspectivas para o desenvolvimento municipal ainda não são boas a curto e médio prazos, no entanto, já surge uma corrente moralizadora que se contrapõe a toda essa onda de descalabro e nos mostra a certeza de que com a implantação dos princípios legais por alguns segmentos da sociedade, teremos a longo prazo, através da mudança comportamental do povo, o clima ideal para o desenvolvimento sócio/econômico.

A certeza da afirmativa anterior é vista através de algumas ações isoladas de políticos (os bons políticos), de instituições públicas e privadas e de alguns juízes que tentam o restabelecimento das Leis.

A população de muitos municípios tenderão a mudar para as melhores escolhas dos sucessores na administração pública, ou por já terem experimentado os lados bons e ruins, ou por tomarem administrações de cidades vizinhas como exemplos.

Juazeiro, BA, em 04 de junho de 1993

NILDO LIMA SANTOS
Palestrante

     
    
                
   




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