domingo, 2 de setembro de 2012

Incidente de falsidade – Alegações temerárias – Litigância de má-fé






Juiz George Santos Almeida
1. RELATÓRIO
NILDO LIMA SANTOS reclamou contra MUNICÍPIO DE JUAZEIRO - BAHIA, denunciando os fatos e formulando os pedidos que constam da inicial (fls. 01/04), cujos termos são adotados como parte integrante deste relatório. A peça vestibular veio instruída com documentos (fls. 06/86). Não foi aceita a proposta inicial de conciliação. O Reclamado ofereceu defesa e juntou documentos (fls. 96/112), tendo, na oportunidade, suscitado incidente de falsidade. A alçada foi fixada. Suspendeu-se o curso da ação principal, retirando-se o processo de pauta. O Reclamante contestou o incidente e juntou novos documentos, dos quais se deu vista ao Reclamado, que quedou em silêncio, consoante certidão de fl. 165. O processo foi reeincluído em pauta. A Secretaria procedeu à conferência das cópias dos documentos questionados, confrontando-os com os originais residentes nos autos, e autenticando-os conforme está certificado à fl. 173. As partes se manifestaram. Em seguida, não havendo mais provas a serem produzidas, a instrução foi encerrada, ficando as partes cientes de que o incidente de falsidade seria apreciado pelo Juízo como capítulo prefacial da decisão a ser proferida, tendo em vista a celeridade e economia processuais. Razões finais reiterativas. Debalde o encaminhamento da última proposta de conciliação. Autos conclusos. É o relatório.

2. FUNDAMENTOS

2.1. Incidente de falsidade documental

Inicialmente, esclareça-se que o procedimento excepcionalmente adotado, no presente caso, quanto ao incidente de falsidade, deve-se ao fato de que toda a prova já foi produzida pelas partes, não apenas quanto à questão incidental, como também em relação aos demais pontos controversos da lide. De maneira que a conclusão do processo, tão-somente para julgamento do incidente, em nada contribuiria, antes prejudicaria enormemente a celeridade processual, sobretudo porque, nesta especializada, não cabe recurso da decisão que julga o incidente de falsidade, em face do disposto no art. 893, § 1º, da CLT. Ademais, o entendimento doutrinário mais abalizado é no sentido de que a suspensão exigida pelo art. 394 cumpre a finalidade precípua de ensejar à parte contrária a oportunidade para responder o pedido incidental. Segundo o magistério de Humberto Theodoro Júnior, “Obtida a resposta, não haverá uma instrução separada só para o incidente. Ao contrário, em se tratando de causas conexas, tal como se dá com a reconvenção e a declaratória incidental, o incidente de falsidade e o pedido principal serão objetos de instrução e julgamento comuns” (Curso de Direito Processual Civil, Vol. I, 10ª edição, Forense, pág. 454). Acrescenta o autor, citando Carlos Silveira Noronha: “Em suma: antes do encerramento da instrução, “a alegação de falsidade documental constitui-se em mero incidente do processo principal, que se realiza nos próprios autos”. Mas, qualquer que seja a fase do processo, desde que não tenha sido ainda proferida a sentença de primeiro grau de jurisdição, entendemos que deve prevalecer a lição de Pontes de Miranda, no sentido de que “sempre que o documento se produziu como base e se argúi contra a sua força probatória formal, a questão do falso pode ser prejudicial, mas está intimamente ligada ao pedido, podendo ser julgada simultaneamente com a ação principal”. Isso, evidentemente, não retira do incidente o seu caráter de ação declaratória incidental” (obra citada, pág. 455). Feitos esses esclarecimentos, passemos à apreciação do incidente de falsidade documental suscitado pelo Reclamado.

A argüição do falso tem em mira os documentos de fls. 06 a 09, que instruíram a inicial. Ocorre que o Reclamado não se desincumbiu do ônus que lhe impõe o art. 389, inciso I, do Código de Processo Civil. Nada provou e ainda deixou fluir in albis o prazo que lhe foi assinado para que se manifestasse sobre a prova suplementar trazida pelo Reclamante. Sua manifestação extemporânea às fls. 177/178 nada esclarece a respeito do fato investigado, nem retira o valor das autenticações realizadas pela Secretaria da Vara. De resto, os documentos impugnados encontram-se devidamente assinados pelos gestores e prepostos do Município, cujas firmas não foram contestadas. Portanto, reputam-se autênticos os documentos atingidos pela argüição, restando a este Juízo, na forma do art. 395, do CPC, declarar a autenticidade dos mesmos.

Considerando, por fim, que o ataque aos documentos foi feito sem a necessária comprovação do falso, revelam-se temerárias as alegações do suscitante, cuja conduta é tipificada como litigância de má fé, merecendo sofrer as iras do art. 18 e seu § 2º, da norma adjetiva civil, aqui supletivamente aplicada. Por conseguinte, impõe-se ao Município Reclamado o pagamento, em favor do Reclamante, de indenização correspondente a 10% sobre o valor da causa.

2.2. Exceção de incompetência em razão da matéria

A preliminar é argüida sob o fundamento de que, por força da Lei Municipal nº 1.460/96, o reclamante passou a ser estatutário, não mais estando sujeito à legislação trabalhista.
Ocorre, todavia, que a causa de pedir contida na inicial faz menção à existência de vínculo empregatício entre as partes – tanto assim que é instruída com cópias da CTPS do autor – e contém pedido de vantagens trabalhistas, ou seja, direitos típicos de uma relação de emprego, como FGTS, multa de 40% sobre o FGTS e multa prevista no art. 477, § 8º da CLT, além de outros que se identificam tanto com o vínculo empregatício quanto com o vínculo estatutário, a exemplo da estabilidade, férias acrescidas de 1/3 e salários latu sensu. Com efeito, a competência material do Juízo se define a partir da causa de pedir e do pedido que constam da inicial. Como, no presente caso, esses elementos se reportam à relação de emprego, forçoso é reconhecer que é a Justiça do Trabalho o foro competente para solucionar o litígio, adentrando o mérito da causa. A circunstância do reclamante ter-se tornado servidor público estatutário, a partir da instituição do Estatuto dos Funcionários Públicos do Município de Juazeiro, não afasta a competência deste Juízo para dizer se o mesmo faz jus aos direitos que reivindica.

Portanto, fica rejeitada a preliminar.

2.3. Prescrição

O Réu argüi a prescrição bienal prevista no art. 11, da CLT, alegando que o direito de ação quanto às pretensas vantagens trabalhistas somente foi exercitado pelo Autor quando já superados dois anos da conversão do regime celetista para o estatutário. Tem razão, em parte. Com a vigência da Lei Municipal nº 1.460, de 19 de novembro de 1996, o vínculo que era trabalhista passou a ser estatutário, pondo fim à relação de emprego. Essa conversão de regimes, portanto, extinguiu o contrato de trabalho. De modo que, a partir de então, começou a fluir o prazo prescricional de dois anos para que o Autor pudesse questionar possíveis vantagens. Porém, como a ação somente foi proposta em 17 de fevereiro de 2003, o direito quanto aos créditos decorrentes da extinta relação de emprego foram tragados pela prescrição. Logo, impõe-se a extinção do processo com exame de mérito, a teor do art. 269, IV, do CPC, em relação às vantagens trabalhistas anteriores à instituição do novo regime jurídico, como é o caso do FGTS. Entretanto, não são atingidos pela prescrição bienal os demais direitos reivindicados pelo Autor, todos eles referentes ao período posterior à edição da Lei Municipal invocada, porquanto não transcorreu o prazo de dois anos entre o ato acusado de lesivo e a propositura da ação.

2.4. Direitos reivindicados pelo autor

2.4.1. Estabilidade e reintegração

Alegando ser beneficiário da estabilidade prevista no art. 19, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, o Autor, que foi exonerado por ato sumário do Secretário de Administração Municipal, requer sua reintegração ao quadro de servidores públicos do Município Reclamado.

Como se vê, embora reivindicando o reconhecimento de vínculo empregatício e a estabilidade excepcional por ter sido admitido há mais de cinco anos da promulgação da Constituição Federal de 1988, o Autor invoca concomitantemente o Estatuto dos Servidores Públicos do Município de Juazeiro, tanto assim que o traz à baila, sem qualquer restrição. Não há como reconhecer a existência de vínculo de emprego durante todo o período mencionado na peça incoativa, porquantoa partir da edição da Lei Municipal nº 1.460/96 a relação de trabalho havida entre as partes passou a ser estatutária. Conseqüentemente, não pode ser a legislação trabalhista invocada como supedâneo da pretensão deduzida em face do Município Reclamado. Como o ato de exoneração é contemporâneo à vigência de lei especial que rege o funciona-lismo público municipal, a ação pertinente destinada a combate-lo deve ser intentada na Justiça Comum, foro competente para apreciar e julgar a matéria (estabilidade e direito à reintegração de servidor público estatutário).

Em suma: à luz da legislação obreira, na qual tem arrimo a causa de pedir, o Autor não faz jus a estabilidade e, conseqüentemente, à reintegração no emprego, uma vez que já não era mais empregado do Réu no momento em que foi dispensado. De modo que sua pretensão somente pode escorar na norma especial que rege o funcionalismo público do Município de Juazeiro, tendo como causa de pedir remota o vínculo estatutário, devendo ser dirigida ao juízo competente para apreciar e julgar a matéria. Para que não paire qualquer dúvida, convém ressaltar: a improcedência do pedido ora pronunciada faz coisa julgada nos limites da lide, onde a causa de pedir e os pedidos dizem respeito a uma relação de emprego que não restou reconhecida. Assim, ante a inexistência do vínculo empregatício afirmado na exordial, nega-se a pleiteada reintegração.

2.4.2. Parcelas diversas (salários retidos, férias vencidas, terço de férias, 13º salário, multa de 40% sobre o FGTS e multa do art. 477, § 8º, da CLT)

Os fundamentos adotados no item anterior se aplicam também ao presente tópico. A inexistência de relação de emprego, decorrente da alteração de regime jurídico aplicável ao Reclamante, afasta o direito às parcelas em destaque. Se o vínculo empregatício, que constitui a causa de pedir, não é reconhecido, conseqüentemente não se pode atender ao pedido.
Por conseguinte, nega-se o pagamento das verbas reivindicadas.

3. CONCLUSÃO

Em face do exposto, rejeito a preliminar de incompetência material e, no mérito, declaro a prescrição quanto ao FGTS do período anterior à instituição do regime jurídico estatutário, extinguindo o processo nos termos do art. 269, IV, do CPC, e julgando IMPROCEDENTES os demais pleitos contidos na reclamação proposta por NILDO LIMA SANTOS contra o MUNICÍPIO DE JUAZEIRO – BAHIA.

Condeno o Reclamado a pagar ao Reclamante indenização correspondente a 10% sobre o valor da causa, por litigância de má fé, conforme disposto no capítulo 2.1. desta decisão. Custas, pelo Reclamante, no importe de R$20,00, calculadas sobre R$1.000,00, valor arbitrado à causa para esse efeito.
Leia-se e publique-se em audiência para esse fim já designada.

Juazeiro, 18 de março de 2003.

George Santos Almeida
Juiz Titular


COMENTÁRIOS DO RECLAMANTE (Autor da Ação):

A decisão, também foi temerária, vez que, a prescrição do FGTS é trintenária e, ainda, o fato de que, a indenização de 10% incide sobre o processo accessório sobre que corresponde à incidência de falsidade, onde o autor pediu danos morais no valor de R$100.000.000,00 (cem milhões de reais) e, assim reclamou na execução o que não foi concedido. Outro fato estranho é que o processo deveria subir de ofício para o Tribunal, considerando a ação ter sido impetrada contra ente público, que deveria avaliar a sentença, o que não ocorreu, sendo o processo arquivado na vara onde foi julgado. 

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