NILDO LIMA SANTOS
Consultor em Administração Pública. Bel. Em Ciências
Administrativas
– Juazeiro – Ba - Fone: (74) 8107-5334
Referência: Ação Ordinária de Nulidade de Ato Administrativo,
cumulada com cobrança, com pedido de Tutela Antecipada contra o Município de
Aiquara – Ba – Protocolo 7775/02 – 18 março 2002 – Comarca de Itagibá – Ba –
Parecer.
I – RELATÓRIO
1. No mês de Outubro de 1997, especificamente no dia 17, o
Prefeito da época, Sr. Manoelito Fernandes, através do Decreto nº 1.892,
revogou e anulou os Decretos de nº 1.760, de 14 de novembro de 1995 e 1.761, de
30 de novembro de 1995, editados pelo seu antecessor Moacyr Viana Júnior. Por
consequência foram demitidos os servidores que fizeram o concurso na época e
que foram empossados por força destes instrumentos, alcançando desta forma os
autores da ação sob análise.
2. Chamamos a atenção para o fato de que parte destes
servidores continuaram trabalhando na administração municipal, na condição de
temporários e, parte se submeteu a um novo concurso público neste mesmo
empregador (município), com a intenção de se efetivarem. Inclusive, dos que
permaneceram trabalhando encontramos os seguintes servidores autores da ação: ELENIR SANTOS LISBOA, JUSCILENE CAROLINO DE
MELO BORGES, MARIA DO CARMO ARQUIMINIO DOS SANTOS; NEUZA ....., ROSICLEIDE
SANTOS MELO E ROSÁLIA SOUZA PEREIRA.
3. O Decreto nº 1892 que anulou o Concurso Público nº
001/95 foi editado por ter levado em consideração o seguinte:
3.1. inexistência de Plano de Carreira aprovado por Lei
para o Município de Aiquara, conforme estabelece e exigem a Constituição
Federal (art. 39) a Lei Orgânica Municipal (art. 18) e a Lei Municipal nº
320/95 de 21/06/95 que implantou o Regimento Jurídico Único (art. 6º);
3.2. inexistência de cargos e vagas criados por Lei, na
forma exigida pelo art. 37, inciso VII da Lei Orgânica Municipal e artigo 37,
incisos I e V da Constituição Federal;
3.3. a necessidade do restabelecimento do nível de despesas
a índices aceitáveis e legais no cumprimento ao artigo 169 da Constituição
Federal e à dispositivos da Lei Complementar nº 82, de 27 de março de 1995, que
estabeleceu o limite de gastos com pessoal para as administração públicas;
3.4. a prerrogativa legal que tem o Chefe do Executivo para
exonerar os ocupantes dos cargos públicos, tendo como amparo o art. 76, I,
combinado com o art. 22, todos da Constituição Federal, que sujeita os
servidores em estágio probatório à demissão no interstício de dois (2) anos
contados da data de sua admissão, a interesse da administração pública;
3.5. o princípio de legalidade, pela lógica da
inexistência de Leis criando cargos,
abrindo vagas e definindo os salários;
3.6. o princípio da realidade que se amparou na análise
real da situação financeira e jurídica quanto a forma do provimento dos cargos
na administração municipal de Aiquara que se deu através de atos não
apropriados à exigência da Constituição Federal e das Leis Municipais maiores
(Lei Orgânica Municipal e Lei 320/95).
3.7. o princípio da sindicabilidade na análise necessária
onde se constatou a inexistência de normas fundamentais à manutenção do
controle da legalidade e da legitimidade dos atos públicos;
3.8. o princípio da responsabilidade, que implicou na
necessidade da aplicação das medidas cabíveis em decorrência de violação das
normas e, para que o gestor não fosse incurso em crime de omissão;
3.9. o princípio da razoabilidade que foi aplicado à luz da
realidade jurídica e financeira do Município naquele instante;
3.10. o princípio da motivação que foi aplicado por força
de toda esta realidade e da análise jurídica da situação naquele momento;
3.11. o princípio da continuidade dos serviços públicos que
foi entendido e relacionado naquele instante com a necessidade de se preservar
as finanças públicas para que atendessem homogeneamente as demandas dos
serviços públicos básicos a cargo do Município de Aiquara;
3.12. o princípio da executoriedade que foi nada mais e
nada menos do que a execução, pela autoridade administrativa, dos seus próprios
atos editados à luz dos princípios do Direito.
4. Os ex-servidores, COSME GONÇALVES DE SOUZA, JACI SILVA
PALMITO, LUZINETE MARIA DE ALMEIDA LOPES, REGIANE SANTOS MELO E ZENILDA DE SOUZA
SANTOS, na época em que foram demitidos, bem assim também todos os outros que
permaneceram trabalhando com contratos especiais; ou com nomeações para cargos
comissionados com natureza jurídica bem definida na formalização dos atos de
contratação; em razão de terem sido
alcançados pelo Decreto nº 1892, de 17 de outubro de 1997, contavam menos de
dois anos de serviços na administração municipal de Aiquara e, desde a data de
suas demissões (17/10/97) até a data da ação “in casu” (14/03/2002) foram
transcorridos quatro (4) anos e cinco (5) meses.
5. A única norma jurídica até hoje existente e aplicável ao
servidor público do Município de Aiquara ainda é a Lei Municipal nº 320, de 21
de junho de 1995. Situação que se perdura em razão da negação do Poder Legislativo em apreciar os projetos que lhe foram
encaminhados e que versam sobre a base do regime jurídico dos servidores da
administração pública municipal de Aiquara (PCCS Geral, PCCS p/Magistério,
Estatuto Geral dos Funcionários Públicos e Estatuto do Magistério).
6. Na época o ex-Prefeito Moacyr Viana Júnior promoveu o
Concurso Público sem o respaldo legal quanto à situação jurídica dos cargos
para que se enquadrassem na condição de efetivos, entretanto cumpriu
dispositivo constitucional que diz que os cargos públicos, excetuando-se os
comissionados, em qualquer situação de vínculo, são providos somente por
concurso público, sejam estes para a administração direta ou para a
administração indireta.
7. Este fato continuou a se repetir no governo do ex-gestor
Sr. Manoelito Fernandes que promoveu concurso público sem a existência de atos
legais que amparasse o provimento dos cargos na condição de efetivos e que
definisse os vencimentos e o regime jurídico; talvez, por desconhecer que o
artigo 14 da Lei 320/95, de 21 de junho de 1995 revogou todas as normas
anteriores à sua edição.
8. Atenção deverá ser dada ao fato de que, por ausência de
compromisso da Câmara Municipal que se recusou e se recusa até hoje a cumprir o
seu papel nas funções legislativas, o ex-Prefeito Moacyr Viana Júnior editou o
decreto de nº 1760, de 14 de novembro de 1995 na intenção de criar cargos
públicos e abrir suas respectivas vagas para provimento na administração pública
na tentativa de suprir as lacunas legais que ficaram abertas no Município de
Aiquara e, para atender às pressões do Tribunal de Contas dos Municípios e do
Ministério Público Federal. O seu papel foi cumprido com a promoção do concurso
público que, independentemente do
vínculo jurídico de trabalho é uma exigência para todos os organismos públicos,
inclusive para os entes descentralizados com figuras jurídicas típicas das
empresas privadas, conforme já dissemos anteriormente. Contanto, os concursados
daquela época e de épocas posteriores, até esta data, em hipótese nenhuma,
estão caracterizados como funcionários efetivos e estáveis. Estes são,
simplesmente, prestacionistas de serviços públicos e extranumerários; até que
por uma decisão política - assim como ocorreu com os servidores em geral que o
Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Carta Magna lhes deu
direito à estabilidade, da qual não gozavam -, possa resolver o problema; mas, tão somente para aqueles que
continuam em efetivo exercício na administração pública municipal e em qualquer
um dos Poderes e, rigorosamente, cumprindo as disposições constitucionais. E,
esta decisão política só surtirá os efeitos necessários e posteriores, com a
edição de Lei Municipal que crie os cargos necessários e abra as respectivas vagas
para que tais servidores possam ser declarados efetivos nos termos da Lei, já
que tiveram o provimento por concurso público.
9. Os concursos promovidos pela Prefeitura Municipal de Aiquara
desobedeceram à regra básica definida e implantada pelo Tribunal de Contas dos
Municípios, inclusive não foram submetidos à aprovação e registro necessários
junto a tal Tribunal que estabeleceu como “pressupostos indispensáveis à
realização do concurso público” (Noticiário TCM, janeiro/fevereiro e março
1993):
“2.1. Quadro de Pessoal estabelecido
em lei (Grifo nosso);
- Lei Municipal deverá estabelecer um Plano de Classificação
de Cargos e Salários da Prefeitura, criando as categorias funcionais, os cargos
públicos, suas denominações, salários/vencimentos e quantidades e o regime
jurídico ao qual serão submetidos. (Grifo nosso).
- Lei municipal deverá
estabelecer as regras a serem observadas na realização de um Concurso público;
- Estabelecidas as regras
por Lei Municipal, para cada concurso a ser realizado publicar-se-á,
obrigatoriamente, um Edital de Convocação de Concurso Público.”
10. A Comissão de Exame e Análise do Concurso Público
Municipal Realizado no ano de 1998, nomeada pelo Decreto nº 196/2001, de 29 de
setembro de 2001 concluiu, em sua análise, no relatório datado de 03 de outubro
de 2001, o seguinte:
a) a Lei Municipal nº
156/84, de 01/06/1984 foi revogada integralmente pela Lei Municipal nº 320/95,
de 21/06/95;
b) a Lei Municipal nº 360,
de 10 de junho de 1995 é ilegal por ter tentado ressuscitar uma Lei já morta
pela Lei nº 320/95 e pela própria Lei Orgânica do Município de Aiquara;
c) a Lei Municipal nº
360 não abriu vagas para que houvesse o Concurso Público, portanto não existiam
as vagas supostas para os cargos submetidos a concurso público;
d) o concurso realizado
desatendeu aos princípios da legalidade e da publicidade;
e) a Lei Municipal nº
320/95 é a Única Lei existente para reger o sistema de pessoal do Município de
Aiquara e, esta norma não abriu vagas, (Grifo nosso);
f) a Lei Municipal nº
361/98, também, não abriu vagas para o pessoal do magistério, portanto, não
existiam vagas para que houvesse o Concurso Público para vínculo efetivo; (Grifo
nosso);
g) por fim, a conclusão
a que chegamos foi pela nulidade do Concurso Público nº 01/98, tanto é verdade
que o promotor do concurso “in casu”, reconheceu no quinto considerando do
Decreto nº 1892/97, o qual revogou ato da administração pública municipal
anterior, quando afirmou “que a única legislação existente no Município de Aiquara prevendo a criação, graduação e
organização do quadro de cargos, empregos, vagas e salários dos servidores
públicos municipais, é a contida no inteiro teor da lei nº 156/84, de 01 de
junho de 1984, o que confirma a nulidade do Concurso, como também os
depoimentos dos ex-vereadores de Aiquara, no exercício de 1997 a 2001, EVARISTO
SANTOS BRITO, JOÃO BRITO BARRETO, PEDRO MACEDO BERBERINO E NOELIA FRANÇA DOS
SANTOS”.
II – DA LEGISLAÇÃO E DA
DOUTRINA
II – 1. DA CONSTITUIÇÃO
FEDERAL
11. Na época em que o Decreto nº 1892 foi editado, vigorava
o seguinte dispositivo da Constituição Federal:
“Art. 39. A União, os
Estados, o Distrito Federal e os Municípios instituirão, no âmbito de sua
competência, regime jurídico único e planos de carreira para os servidores da
administração pública direta, das autarquias e das fundações públicas.”
12. No artigo 37 da C.F., alterado pela Emenda
Constitucional nº 19/98, assim dispõe para a administração pública:
“Art. 37. A
administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos
Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de
legalidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte;
I – os cargos, empregos
e funções públicas são acessíveis aos brasileiros que preencherem os
requisitos estabelecidos em lei, assim como aos estrangeiros, na forma da
lei; (Grifo nosso).
II – a investidura em
cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de
pessoas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do
cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações
para cargos em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração; (Grifo nosso),
III – Omissis
IV – Omissis
V – as funções de
confiança, exercidas exclusivamente por servidores ocupantes de cargos
efetivos, e os cargos em comissão, a serem preenchidos por servidores de
carreira nos casos, condições e percentuais mínimos previstos em lei, destinam-se
apenas às atribuições de direção, chefia e assessoramento; (Grifo nosso);
VI – Omissis
VII – Omissis
VIII – a lei
reservará percentual dos cargos e empregos públicos para as pessoas portadoras de deficiências e
definirá os critérios de sua admissão.
IX – Omissis
X – a remuneração dos servidores públicos e o
subsídio de que trata o & 4º do artigo 39 somente poderão ser fixados ou
alterados por lei especifica, observada a iniciativa privada em cada caso,
assegurada revisão geral anual sempre na
mesma data e sem distinção de índices;” (Grifo nosso).
II – 2. DA LEI ORGÂNICA
MUNICIPAL
13. A Lei Orgânica do Município de Aiquara, em seu artigo
18, ainda em pleno vigor, assim dispõe sobre os cargos públicos:
“Art. 18. Lei
complementar instituirá regime jurídico único e plano de carreira para os
servidores da administração pública direta, das autarquias e das fundações
públicas.”
14. Sobre a necessidade da exigência de Lei para criação de
cargos e empregos públicos encontramos no artigo 37 e dispositivos da Lei
Orgânica do Município de Aiquara:
“Art. 37. Cabe à Câmara
Municipal com a sanção do Prefeito, legislar sobre todas as matérias de
competência do Município, especialmente sobre:
I -
........................................................................
VII – criação,
transformação e extinção de cargos, empregos e funções públicas municipais e
respectivos planos de carreira e vencimentos;”
II. 3. DA DOUTRINA
QUANTO A LEGALIDADE DOS CARGOS
15. Cargo público, doutrinariamente, é o lugar que deverá
ser ocupado pelo servidor público civil, criado por lei, com denominação,
funções e remuneração próprias. Para que exista o cargo, necessariamente, tem
que existir a vaga. Não existe a ocupação de cargo sem que antes tenha sido
criado a vaga. Portanto, a Lei ao criar o cargo público, também, deverá
informar o número de vagas referente a tal cargo.
16. Buscamos em José Cretella Júnior, in Curso de Direito
Administrativo – 10ª Edição, revista e atualizada Forense – Rio de Janeiro – 1989, o seguinte:
“Materialmente falando,
(cargo público) é o lugar, o espaço, o circulo em que se locomove o agente
público para poder desempenhar os deveres que lhe são atribuídos por lei. Cargo público, a nosso ver, é o lugar e o conjunto
de atribuições a ele inerentes, confiado pelo Estado a uma pessoa física que,
agindo em nome deste, desenvolve atividades de interesse coletivo.”
17. Hely Lopes Meirelles, in Direito Municipal Brasileiro,
LTR, Rio de Janeiro, pg. 644, afirmou que, para o provimento dos cargos
públicos há a necessidade de suas criações por lei. Eis, na íntegra o que diz o
texto:
“O provimento dos cargos
e a movimentação de funcionários dentro dos quadros administrativos, já
instituídos por lei, são atribuições privadas do Chefe do Executivo.”
(Grifo nosso).
18. Os renomados autores apenas ratificaram o que já está
pacificado na doutrina e na jurisprudência pátria sobre a criação dos cargos
públicos por Lei com denominações próprias e quantidades certas. Exemplo claro
é a Lei nº 2.323, de abril de 1966, que dispõe sobre o Estatuto dos
Funcionários Públicos do Estado da Bahia, que em seu artigo 2º, assim
conceituou cargo público:
“Art. 2º Cargo Público,
para os efeitos deste Estatuto, é o conjunto de atribuições e
responsabilidade cometidas a um funcionário, com as características essenciais
de criação por lei, denominação própria, número certo e pagamento pelos cofres públicos.” (Grifo
nosso).
19. Outro exemplo é
encontrado nos anuais normativos do próprio Município de Aiquara, especialmente
na Lei nº 097, de 01 de outubro de 1972 que dispôs sobre o Estatuto dos
Funcionários Públicos. Diz o artigo 3º
de tal instrumento:
“Art. 3º Cargo
Público é criado por lei com denominação
própria em número certo e pago pelos
cofres do Município, cometendo-se ao seu titular um conjunto de deveres,
atribuições e responsabilidades.” (Grifo nosso).
II. 4. DA DOUTRINA
QUANTO A EFETIVIDADE DOS CARGOS
20. A Lei Municipal nº 156, de 01 de junho de 1984, que o
ex-gestor Manoelito Fernandes tentou
ressuscitar pela Lei Municipal nº 360 de 10 de junho de 1995, já morta pela Lei
Municipal nº 320/95 e, pela própria Lei Orgânica do Município de Aiquara, assim
definiu sobre a situação jurídica dos cargos públicos municipais:
“Art. 7º O quadro de
pessoal é composto de uma parte permanente e de uma parte temporária.
§ 1º parte permanente é
constituída de:
I – cargos de provimento
efetivo;
II – cargos de
provimento em comissão;
III – função
gratificada;
§ 1º (omissis)
§ 2º A parte temporária
é constituída por servidores contratados sobre o regime da Legislação
Trabalhista, podendo o Prefeito Municipal altera-la, mediante decreto, sempre
que o volume de serviço justificar a contratação.”
21. Neste mesmo diploma legal ficou estabelecido no Capítulo
II (Lei 156/84) o seguinte para os cargos públicos:
“Art. 8º Os cargos
classificam-se em cargos de provimento efetivo e cargos de provimento em
comissão.
Art. 9º Cargo de
provimento efetivo é aquele preenchido em caráter permanente, mediante concurso
público de provas escritas e/ou práticas e de títulos, para o nível inicial da
classe.
Parágrafo Único. Os
cargos de provimento efetivo são os constantes do Anexo I desta Lei.”
22. O Anexo à Lei 156/84 aprovou cargos e criou vagas para a
Prefeitura de Aiquara. Entretanto, se estas vagas não foram preenchidas por candidatos na época, não mais
existem, por força da Constituição Federal de 1988 que estabeleceu novas regras
para o provimento dos cargos públicos e, ainda, por força de normas municipais posteriores que a
revogaram integralmente. A exemplo a Lei Municipal nº 320/95, de 21 de junho de
1995 que instituiu o regime jurídico único para os servidores do Município de
Aiquara. Por este instrumento foram revogadas todas as normas pretéritas que
tratam de provimento e normatização dos cargos públicos. Inclusive, por ter
esta, disposto no seu artigo 12 de que a
partir da data de sua publicação o Poder Executivo encaminharia à Câmara Municipal os seguintes
projetos de Lei:
a) reestruturação da administração municipal;
b) sistema de carreira dos servidores públicos;
c) plano de carreira e vencimentos;
d) estatuto dos funcionários públicos do
município;
e) estatuto do magistério público municipal.
23. Devemos ficar atentos para o fato de que a Lei 320/95,
definitivamente enterrou toda a legislação pretérita para os servidores
públicos do Município de Aiquara a partir de sua edição. Sobre esta
questão não há duvidas. Foi esta norma
que definiu o regime único para o Município de Aiquara, para atender ao que a
Constituição Federal exigia na época. Entretanto, para que não houvesse vácuo
jurídico, esta Lei adotou o Estatuto dos Funcionários Públicos do Estado da
Bahia e do Magistério Público Estadual para os Servidores do Município de
Aiquara (Art. 12, § Único). A verdade é que a partir de 21 de junho de 1995 até
a data atual, não existe no Município de Aiquara, nenhum instrumento legal que
o ampare a promover concurso público para cargos efetivos; e, todos os cargos
municipais, tenham sido estes providos por concursos ou não, a partir de tal
data, estão caracterizados como temporários. Uns por terem sido criados nestas
condições, como é o caso dos comissionados. E, outros por não terem sido
criados e, abertas às respectivas vagas por Lei; e, ainda, por não terem sido
estabelecidas regras jurídicas próprias para que subsistam na condição de
efetivos e na condição de estáveis, pois as normas jurídicas sobre pessoal
aplicadas ao Estado da Bahia, não servem para o Município de Aiquara ou
qualquer outro ente federado que seja.
24. Apesar do legislador Municipal, ao elaborar a Lei 320/95
ter se preocupado com o vácuo jurídico, ao inserir o Parágrafo Único ao artigo
12 em tal instrumento legal; o município caiu neste vácuo por ter se omitido
nas providências em razão de não ter
implantado as normas necessárias que dariam a base jurídica para o
pessoal da administração pública municipal.
25. O ex-gestor da época e promotor do Concurso Público
01/96, encurralado pelo TCM, que exigia a promoção do Concurso Público para as
contratações sob o risco da rejeição das suas contas; e, pelo Ministério
Público da União, que também exigia a promoção do concurso público, sob o risco
de denunciá-lo judicialmente; e, ainda, encurralado pela omissão e oposição
sistemática da Câmara Municipal de Vereadores da época, não teve outra saída a
não ser promover a edição do Decreto de nº 1.761, de 30 de novembro de 1995 o
qual abriu vagas para a Prefeitura Municipal de Aiquara. Foi uma tentativa
desesperada e, que de certa forma o eximiu da grande responsabilidade que, de
certa forma deverá recair sobre a Câmara
Municipal que até hoje tem se omitido em apreciar os projetos que lhes são
encaminhados e que definem a base jurídica dos servidores públicos municipais.
Contudo, apesar da criação dos cargos e abertura das respectivas vagas pelo
Decreto Executivo, existe uma imensa distância para que os servidores
concursados para as vagas e cargos criados por este, sejam reconhecidos como
ocupantes de cargos efetivos. A razão é simples: - Decreto não é Lei e, somente
poderão ser criados cargos públicos mediante Lei. Isto já está pacificado nas
normas, na doutrina e na jurisprudência
pátrias.
26. Reforçamos a tese da inexistência dos cargos motivos da
ação em analise impetrada contra o
Município de Aiquara com a exposição dos seguintes ensinamentos de José Cretella
Júnior, in Direito Administrativo – Perguntas e Respostas – 5ª Edição – Forense
– 1994 – Rio de Janeiro:
“Pode haver cargos sem
titular, como, por exemplo, nos casos de vacância. Se o titular faleceu e o
cargo ainda não foi provido, temos cargo sem titular, cargo vago. Por outro
lado, pode haver titular sem cargo, como, por exemplo, nas hipóteses de
extinção do cargo. O titular é posto em disponibilidade até seu obrigatório
aproveitamento em outro cargo equivalente. Enquanto não foi aproveitado, temos
o titular recebendo remuneração, mas não temos cargo. Desse modo,
podemos concluir que as noções de cargo e titular, embora de certa forma
correlatas, não se confundem, assim como órgão e titular também são noções que
não se identificam.”
27. Continua
Cretella Júnior:
“A nomeação é feita
em caráter efetivo quando se trata de cargo de carreira ou isolado que desse
modo deva ser provido.
Funcionário efetivo é
aquele nomeado para cargo que assim deva ser provido, já que efetividade é tipo
de nomeação. O funcionário efetivo torna-se efetivo assim, que se perfaz a
nomeação, não dependendo a efetividade do decurso do tempo. O funcionário
torna-se efetivo no cargo, não no serviço.
Os elementos
obrigatórios, que integram a noção de funcionário público, stricto sensu, são:
a) a investidura, ou
seja, a cerimonia solene da posse, no ato de assunção;
b) a legalidade da
investidura, ou seja, a inexistência de erro formal, nessa ocasião;
c) a existência de
cargos públicos, ou seja não basta a função, não basta o desempenho efetivo do
exercício; é necessária a existência do cargo público, lotado, criado por lei.
Sem esses elementos (o cargo público e a legalidade de investidura) a pessoa
pode prestar serviços públicos e desempenhar funções públicas sem possuir o status
de funcionário público.”
II – DA JURISPRUDÊNCIA QUANTO A EFETIVIDADE
DO
CARGO
28. O Supremo
Tribunal Federal, em 2ª Turma no RE nº 75.121 – SP, Relator Min. Bilac Pinto,
RDA 129/113, assim se pronunciou em determinados trechos da peça jurídica:
“Como os impetrantes
assentam sua pretensão apenas na circunstancia de serem efetivos no cargo em
decorrência de serem estáveis, tem-se que, arredado esse pressuposto, aquela
conclusão também desmerece. Ademais, no caso, os impetrantes são extranumerários,
exercem função, não ocupam cargo algum. Para o atendimento do seu pedido seria
necessário a criação de cargos, o que é defeso ao judiciário. Pelo exposto,
conhece-se da impetração, mas derroga-se a ordem requerida, condenando-se os
impetrantes nas custas.
..........................................................................
Finalmente, o art.
153, § 21, foi rigorosamente observado, pois, no caso concreto, os impetrantes,
não tem nenhum direito à efetivação em cargos, que sequer existem, e muito
menos direito líquido e certo.
........................................................................
Com efeito, trata o
recurso extraordinário nº 69.372 –SP, de caso distinto, ou seja, de professoras
primárias que estavam no exercício do cargo em caráter interino. Cuida a espécie de professores contratados regentes
de aulas excedentes do ensino de grau médio, que não exercem cargo algum, mas
função no serviço público. Portanto, a tese de que “o reconhecimento da
estabilidade importa, necessariamente, na efetividade” há de ser entendida em
termos, ou seja: o pressuposto mínimo para o reconhecimento da efetividade é a
existência do cargo. Se não há cargo, não há como proclamá-la.
........................................................................
Primeiro, porque é
tranqüila a jurisprudência desse STF no sentido de que quem não exerce cargo
não pode ser efetivado.
........................................................................
E que os recorrentes
não exercem cargo público não padece a menor dúvida. A sua correta situação, em
face da Administração, está precisamente caracterizada nas informações
prestadas pela autoridade coatora (recurso extraordinário nº 74.442, fes.): “É
que, ao lado de quadro dos funcionários públicos, foi se criando outro, o dos
servidores extraquadro, ou extranumerários (entre os quais, obviamente, podem
ser incluídos os regentes de aulas excedentes) admitidos para o exercício de
funções não permanentes, cuja precariedade e transitoriedade não aconselhavam a
criação dos respectivos, cargos.”
29. O Concurso Público não é o suficiente para a efetivação.
Para que o servidor seja considerado efetivo é necessário que este tenha sido
aprovado em concurso público para cargo público criado por lei específica com
denominação e conjunto de atribuições próprias; vagas quantificadas e valor do
salário atribuído ao mesmo; e, que seja declarado como efetivo na própria lei
que o criou. Desta forma se conclui que não existiram cargos, no Município de
Aiquara, para os concursados em 1995; e, como conseqüência cai por terra
qualquer pleito à efetividade e à reintegração de ex-servidores da Prefeitura
Municipal de Aiquara, excetuando-se os casos de estabilidade adquirida por
força das Disposições Transitórias da Constituição Federal de 1988.
IV – DA JURISPRUDÊNCIA
QUANTO A ESTABILIDADE NO CARGO
30. A estabilidade no serviço público para o pessoal
concursado do quadro efetivo somente, na égide da C.F. quando vigorava
plenamente em 1997, época em que autores da ação em análise foram demitidos,
sem as suas alterações posteriores, somente se dava com dois anos e um dia de
efetivo exercício de cargo público. Isto é, após ter cumprido o estágio
probatório de dois anos, o que não foi o caso dos autores da Ação que foram
demitidos bem antes de ter sido espirado o prazo do estágio probatório, caso
estes tivessem direito à efetividade.
31. O Tribunal Regional do Trabalho, 12ª Reg. 1º T (RO
8344/93), Rel. Juiz Humberto d´ Ávila Rufino, DJ/SC 14/12/95, p. 118, assim
decidiu:
“Estabilidade Lei Orgânica
Municipal. Autoridade pública não pode demitir imotivadamente, mesmo o servidor
celetista, quando a Lei Orgânica Municipal assegura a estabilidade ao servidor
concursado após dois anos de efetivo exercício. A perda do cargo só poderá
ocorrer por sentença judicial transitada em julgado ou mediante processo
administrativo em que seja assegurada a ampla defesa ao servidor.”
32. O caso de Aiquara é de fácil compreensão. Se não
existiam os cargos, em razão de não terem sido criados por lei, já exaustivamente
demonstrado nesta peça, como poderia existir a estabilidade ou direito
adquirido de quem nunca exerceu “cargo público” no sentido estrito e jurídico
do termo. Portanto a reclamação dos autores é carente de direito.
V – DA PRESCRIÇÃO
33. A reclamação, para os autores listados no item 2 desta
peça já está prescrita, na conformidade do inciso XXIX do artigo 7º da
Constituição Federal
.
34. Acordão do TRT, 12ª
Reg. 3ª Turma (RO 2345/94), Rel. Juiz Francisco Alano, DJ/SC 27/10/95,
p. 75, assim posiciona a questão da
prescrição:
“Prescrição, Contagem do
prazo. Princípio da proteção. Quando o trabalhador ajuiza a reclamação
trabalhista dentro do período de dois anos após a ruptura do contrato de
trabalho, conforme determina a Constituição Federal no inciso XXIX do artigo
7°, a contagem do prazo prescricional começa
a fluir a partir desta ruptura, retroagindo cinco anos a partir daí, e
não da data do ajuizamento.”
VI – CONCLUSÃO
35. Na verdade não houve a anulação do concurso público mas,
tão somente o ato (Decreto nº 1.892, de 17 de outubro de 1997) serviu como
motivador de providências, respaldadas nas normas jurídicas, para a promoção da
demissão de servidores que se encontravam em situação irregular. Este é o fato,
como também é fato que até hoje o Município de Aiquara não dispõe de normas
jurídicas que sejam capazes de dar uma garantia mínima sequer a quem foi
admitido a partir da Lei Municipal nº 320/95, quer seja por concurso público ou
não.
36. Os autores quando foram demitidos estavam dentro do período
mínimo de dois (2) anos que a Constituição Federal definia como necessário para
ser completado para a estabilidade no cargo efetivo. De forma que, estavam
sujeitos à demissão, também, caso fossem estes considerados efetivos.
37. Por se falar em
efetividade, tais servidores não gozavam deste direito por não terem sido
providos em cargos legalmente criados por Lei.
38. A legalidade dos atos editados (Decretos 1.760, 1.761 e
1.892) é indiscutível por estarem embasados nas normas jurídicas. O que não se
afirma para a pretensão dos autores da Ação e dos promotores do Concurso
Público para a garantia de vínculo jurídico de trabalho revestido de
efetividade e da estabilidade.
39. O Prefeito da época cumpriu o seu papel por ter
promovido o Concurso Público para serventuários (servidores do Município) na
forma exigida pela Constituição Federal, independentemente do vínculo de
emprego, pois é assim que está patente nesta norma máxima. Assim como, também,
o Prefeito que o sucedeu, Sr. Manoelito Fernandes, também, cumpriu o seu papel
por ter sido motivado a providências que, na época, eram as mais corretas e as
mais apropriadas, todas respaldadas nos princípios constitucionais e do Direito
Administrativo. Afasta-se aí a suposição da má fé da administração municipal e
da falta de critérios argumentada pelos autores da Ação.
40. Deverá ser considerado, ainda, o fato de que parte dos
reclamantes está trabalhando no Município e, parte foi alcançada pela
prescrição para reclamação de direitos a reintegração ou qualquer outro
natureza trabalhista, por terem sido demitidos há bem mais de quatro anos.
41. É o Parecer.
Juazeiro,
Ba, em 17 de Maio de 2002
NILDO LIMA SANTOS
Consultor em Administração Pública
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