terça-feira, 13 de setembro de 2016

Emissão e Venda de Ações da Sociedade Anônima de Água e Esgoto - SAAE. Parecer






I – RELATÓRIO PRELIMINAR

1.O antigo Serviço Autônomo de Água e Esgoto, autarquia municipal, através da Lei nº 1.358/98 (art. 4º), se extinguirá a partir da organização e implantação da Sociedade Anônima de Água e Esgoto – SAAE, criada na conformidade do art. 1º desta citada Lei.

2. A Sociedade, juridicamente se enquadra como Sociedade de Economia Mista, regulada pelas disposições da Lei Federal nº 6.404, de 15/12/1976 e pela Lei Federal nº 9.457, de 05/05/1997 que atualiza.

3. O § 1º do art. 235 da Lei 6.404 diz que: “as companhias abertas de economia mista estão também sujeitas às normas expedidas pela Comissão de Valores Mobiliários”.

4. Sobre as companhias de economia mista, os artigos 235 a 242 e dispositivos, orientam sobre a legislação aplicável, constituição e aquisição de controle, e organização.


II – ANÁLISES PRELIMINARES DA LEI DE CRIAÇÃO DA SAAE

5. A Lei nº 1.538/98, apesar de dizer que está criando a Sociedade Anônima de Água e Esgoto – SAAE, não é isto, de fato, que está ocorrendo. A autarquia SAAE, está simplesmente sendo transformada em sociedade anônima, deixando de ser autarquia e passando para sociedade de economia mista.

6. Tipifica a transformação a absorção, pela sociedade criada, de todo o ativo e passivo da autarquia, que, por mais que se queira mascarar não é possível, inclusive porque a escrituração contábil da sociedade criada é uma seqüência da escrituração contábil da entidade autárquica original, apenas com as diferenças relacionadas com as especificidades para os diferentes tipos de figuras jurídicas. Além disto, a autarquia para ser extinta há a necessidade de lei específica só para a sua extinção e baixas imediatas dos seus atos constitutivos junto à Receita Federal. A Lei de extinção deverá ser clara: na destinação do patrimônio e do pessoal, além da responsabilização pelo passivo, da entidade extinta. O que não ocorreu com a Lei nº 1.538/98 que se omitiu em todas estas questões. 

7. O estatuto da SAAE ao vincular tal entidade ao Gabinete do Prefeito contraria o disposto na Lei Municipal nº 1.358 de 03 de julho de 1998 que vincula, através do seu artigo 1º, a entidade à Secretaria de Obras Públicas.

8. A rigor o Estatuto da entidade SAAE deverá ser aprovado por ato normativo de valor menor, ou seja, através de Decreto do Executivo Municipal após sua apreciação pelo Conselho de Administração e Conselho Fiscal da Empresa que deverão obedecer a Lei Federal nº 6.404/76 e Lei Federal nº 9.457/97 que são os instrumentos legais que regulam a constituição e funcionamento das sociedades anônimas.

9. Além das Leis Federais e normas expedidas pelo Ministério da Fazenda e da Comissão de Valores Mobiliários, a SAAE – Sociedade Anônima de Água e Esgotos deverá ainda, especialmente, observar as normas de direito financeiro e sobre contratos e licitações. Isto é, deverá observar a Lei Federal nº 4.320/64 e Lei Federal nº 8.666/94.


III – OBSERVÂNCIA DA LEI 6.404/76 E LEI Nº 9.457/97

10. Para que as ações sejam quantificadas e valoradas, de forma que representem o patrimônio da Empresa, antes de suas emissões e subscrições, há a necessidade de que os bens da empresa SAAE sejam avaliados por três peritos ou por empresa especializada com inscrição na Comissão de Valores Mobiliários – CVM, conforme determina a Lei Federal nº 6.404.

11. A emissão de certificados de ações somente será permitida depois de cumpridas as formalidades necessárias ao funcionamento legal da Companhia. É o que diz o artigo 23 da Lei Federal nº 6.404. O funcionamento legal pressupõe os competentes registros da Sociedade junto à Receita Federal e demais organismos necessários, bem como, a subscrição das ações da Empresa junto à Comissão de Valores Mobiliários que as registrará para que efetivamente sejam distribuídas no mercado com a prévia autorização de tal Comissão segundo define o artigo 19 da Lei Federal nº 6.385, de 7 de dezembro de 1976. Então, a mera liberalidade na emissão de títulos mobiliários à revelia das Leis 6.404 e 6.385 tipifica ilegalidade e crime de responsabilidade do gestor que assim proceder ao não cumprimento da legalidade.

12. O artigo 5º e seu inciso II da Lei Orgânica do Município de Juazeiro, com acerto, considera bens municipais: “direitos e ações que, a qualquer título, pertençam ao Município”. Ainda, na mesma Lei, mais adiante, no artigo 6º do Capítulo III, diz que: “A alienação, o gravame ou cessão de bens municipais, a qualquer título, subordinam-se à existência de interesse público devidamente justificado e serão sempre precedidos de avaliação, autorização legislativa e processo licitatório”, incluindo, na forma da alínea “a” do inciso II deste mesmo artigo, “venda de ações”, que dispensada a licitação somente poderão ser vendidas em Bolsa de Valores.

13. Devemos atentar que a Lei Orgânica apenas copiou a regra já definida há décadas pelas normas jurídicas enquadradas no mesmo Direito Administrativo que define princípios, assim como a Constituição Federal, para a gestão do Estado e da “coisa pública”.

14. A inovação do SAAE é numa afronta à inteligência do cidadão que tem alguma formação acadêmica. É acreditar que o interesse de alguns está infinitamente acima dos interesses públicos e de que ao administrador público é permitido qualquer tipo de química e esperteza para driblar as Leis. É ainda acreditar de que o Município é uma mera figura retórica e de que o poder de sempre agir contra o público será eterno e sem castigos. O pior é que, com justificativas floreadas, os que cavam a trincheira do mal para a sociedade acabam levando de roldão os mais ingênuos e os menos experientes que militam nas organizações públicas.

15. A distribuição de ações da SAAE sem a devida licitação não é permitido nem pelas normas atuais nem pelas normas pretéritas mais remotas. Tal atitude proposta pelo SAAE tipifica crime de responsabilidade para o gestor municipal caso caia nessa armadilha, ainda mais da forma que está caracterizada com pessoas ligadas à administração e ligadas diretamente ao grupo político que governa, principalmente, quando envolve o Procurador Geral do Município que têm a responsabilidade da defesa do público.

16. Na infeliz proposta, o que se sente é que não houve o zelo pelo governo e pelo Chefe do Executivo que tem trabalhado arduamente no resgate da moralidade na administração pública. Percebe-se ainda, que existe uma tentativa de monopólio do controle do SAAE a benefício de um grupo que detém o poder político e quase divino de administrar aquela “autarquia” que se comporta como uma empresa privada que tem como proprietários os seus dirigentes.


V – OBSERVÂNCIA DA LEI FEDERAL Nº 8.666, de 21/06/1993

17. Por orientação constitucional, as mesmas regras que a Lei Orgânica do Município de Juazeiro seguiu em 1990, foram seguidas, também, pela Lei Federal nº 8.666/99, que trata de licitações e contratos para a Administração Pública, incluindo a administração direta, autarquias, empresas públicas e fundações municipais (§ Único do Art. 1º). Regras que estão bem delineadas nos artigos 17, I, a, b, c, d; II, a, b, c, d, e, f, §§ 1º, 2º, 3º, 4º; 18, § Único; 19, I, II e III de tal Lei.

18. Ante a tais exigências que são tão claras para a Administração Pública e para os seus administradores que suponha estarem familiarizados com tais normas, no uso do dia a dia nas prestações de contas junto ao Tribunal de contas dos Municípios e outros Tribunais, é forçoso supormos de que não existe a seriedade na proposta apresentada para a distribuição de ações (quotas partes da empresa pública) ao arrepio das Leis, as quais só poderão ser alienadas mediante licitação ou leilão em Bolsa de Valores, desde que exista a prévia autorização para emissão de tais ações pela Comissão de Valores Mobiliários ligada, como autarquia, ao Ministério da Fazenda.         


VI – CONCLUSÃO

19. Concluímos orientando ao Chefe do Executivo (Prefeito) a interferir no processo de transformação do SAAE em Sociedade Anônima, com a contratação de uma empresa de auditoria ou de consultoria credenciadas pela Comissão de Valores Mobiliários para proceder a mudança da entidade nos moldes da legislação vigente.

20. Alertamos, ainda, para o fato de que outros problemas jurídicos ocorrerão com a transformação de tal entidade pública, principalmente, nas questões relacionadas a pessoal que, a Lei Municipal nº 1.538/98 se omitiu completamente.  

21. Aconselhamos ao Chefe do Executivo Municipal que retome o processo de transformação do SAAE com o envolvimento de técnicos do Município (Prefeitura) que deverão ficar sob a supervisão do Gabinete do Prefeito, para que não seja este apontado como co-responsável, por este processo malfeito e ilegal que não atende aos anseios do Governo nem tampouco ao interesse público.

É o Parecer.

Juazeiro, Ba, em 10 de maio de 2000.



Nildo Lima Santos
Assessor de Planos e Desenvolvimento Organizacional         


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